Theresa Catharina de Góes Campos

 

 

 
LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO: Justiça?

De: LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO
Date: seg., 30 de out. de 2023
Subject: Justiça?

JUSTIÇA?

Seria Justiça? Vejamos. Alexandre Torres sofreu uma negligência médica após uma cirurgia devido a um AVC. Ele retirou o tubo de oxigênio com o qual o haviam entubado. Por quê? Provavelmente, porque sem estar devidamente sedado, ninguém aguenta aquele tubo na garganta. Ao retirá-lo, sofreu falta de oxigênio no cérebro, o que o deixou em estado vegetativo por 16 longos anos.

Em 2009 a juíza da 9a. Vara Cível de Brasília condenou duas empresas a indenizarem o paciente em R$ 200 mil reais. Atualmente, ou seja, 14 anos depois, “o processo aguarda julgamento pelo Supremo Tribunal de Justiça.” (STJ) Senhores, tem um sentimento chamado de vergonha, outro de indignação que conseguem encher nossos corações de amargor e lágrimas. E creio que não estou sozinha, depois de ler a reportagem no Correio Braziliense desta semana.

E dos leitores, ninguém com o menor nível de raciocínio, deixou de se perguntar os motivos desta situação. Cuja injustiça depõe contra tudo o que conhecemos como atos justos. A suscitar questões, perguntas. Como por exemplo: que carga de trabalho e número de processos justificam uma demora de 14 anos para dar uma resposta a uma família gravemente atingida, pela perda de uma vida querida causada por negligência médica? Quais seriam os outros fundamentos desta demora? Quais outros fatores poderiam atrasar indefinidamente o processo de julgamento no STF? Interferência indevida das empresas a sensibilizar quem de direito?

É tudo de uma tristeza infinda. Sob todos os aspectos. E uma pergunta que não quer calar: em que sociedade vivemos nós? A dos discursos vazios? A Justiça é considerada o eixo gravitacional em torno do qual trafegam o autodomínio, a coragem e a sabedoria. Consideram que ela harmoniza pretensões e interesses conflitantes da vida social. Inclusive para permitir a convivência humana. Dizem que ela fundamenta a igualdade, a liberdade e protege contra a arbitrariedade, ou seja, as decisões despóticas, guiadas unicamente pela vontade.No entanto, na demora de 14 anos no caso de Alexandre e sua família, onde estão a igualdade, a liberdade, a decisão que permitiria diminuir a disparidade de poderes entre sua família e as empresas? Onde se perdeu a Justiça? Pois, o que adianta saber jurídico sem sabedoria, sem o autodomínio que fundamenta o caráter dos que decidem?No caso em questão, o sofrimento da perda revela também a tremenda injustiça da demora do julgamento para ressarcir a família financeiramente. Julgamento que tem um objetivo maior: punir aqueles que desdenharam da vida, que a negligenciaram. E a quantia a ser paga pelas empresas deveria ser atualizada. Trata-se de não deixar que os erros e a negligência se tornem crime sem castigo e, portanto, destinados ao esquecimento. Sem reparação ou mudanças.Justiça? Certamente não a nossa. Com raras exceções, não merece este nome. Ao contrário. Não por acaso as prisões se enchem de pobres enquanto os ricos permanecem soltos; os políticos têm seus processos arquivados; e os assassinos, mesmo julgados culpados e com pena de 67 anos de prisão, continuem soltos. Acalentados por um discurso de defesa vazio, a construir uma personalidade que não tem relação com a perversidade das mortes que provocaram.Não há um tempo para sofrer nossas perdas. Assim como não há um tempo para a saudade. Mas deve haver um tempo para a Justiça. Quando indignados nos unirmos contra as arbitrariedades cometidas por aqueles que se dizem seus representantes. (2023/out/luiza)

 

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