REPASSANDO: Gênio da 
													diplomacia ou criminoso de 
													guerra? Henry Kissinger 
													morre aos 100 anos.
 
												UM OBITUÁRIO PREVISTO
 
											
 
											
												Eis o título da introdução do 
												livro "A Sombra de Kissinger " (Kissinger`s 
												Shadow ), cuja leitura recomendo 
												aos amigos, do aclamado 
												historiador Greg Grandin, 
												editado, no Brasil, em 2017, 
												pela Rocco Editora Ltda, na 
												tradução de Bruno Casotti, em 
												que o autor argumenta, que para 
												entender a crise dos EUA 
												contemporâneos - suas guerras 
												intermináveis no exterior e sua 
												polarização política interna - é 
												preciso também entender quem foi 
												Henry Kissinger, agora falecido, 
												aos cem anos, que ele qualifica 
												como o mais controverso 
												estadista americano.
											
												 
											
												Muitos  outros autores, 
												entretanto - o próprio Grandin 
												lembra isso -, sempre 
												consideraram Kissinger como 
												estrangeiro, pois nasceu em 
												Furth, na Alemanha, em 1923, 
												partindo para os EUA, aos 15 
												anos, depois de escapar, por um 
												triz, de ser levado, pela 
												Gestapo, como o foi toda sua 
												família, para o campo de 
												extermínio de judeus, em 
												Auschwitz, o que, de certa 
												forma, explica o tirano, sábio 
												diplomata, em que ele se tornou, 
												mais tarde, responsável, por 
												muitas ditaduras, na América 
												Latina, e inúmeras guerras no 
												mundo.
											
 
											
												
												 Na referida introdução de seu 
												livro, Grandin diz que 
												"Kissinger é acusado de muitas 
												coisas ruins. E quando ele 
												morrer,seus críticos terão uma 
												chance de repetir as 
												acusações".  E continua: 
												"Christopher Hitchens, que, já 
												se foi, defendeu a ideia de que 
												o ex-secretário de Estado 
												deveria ser julgado como 
												criminoso de guerra."  Muito 
												embora -  é preciso também aqui 
												lembrar -,  tenha sido ele 
												agraciado com o Prêmio Nobel da 
												Paz. 
											
 
											
												
												"Mas - prossegue Grandi - há uma 
												longa lista de testemunhas de 
												acusação - repórteres, 
												historiadores e advogados  
												- ávidos por fornecer 
												informações sobre qualquer uma 
												das ações de Kissinger, no 
												Camboja, Laos, Vietnã, Timor 
												Leste, Bangladesh, contra os 
												curdos, Chile, Argentina, 
												Uruguai, entre outros lugares".
											
												
 
											
												Em "Diplomacia " (Diplomacy), 
												considerada sua maximum opus,  
												editado, no Brasil, em 1997, num 
												volume de mil páginas, pela 
												Editora Francisco Alves, na 
												tradução de Saul S. Gefter, no 
												primeiro capítulo, "A Nova Ordem 
												Mundial", Kissinger ousa dizer, 
												que, no século XX, " nenhuma 
												sociedade insistiu - 
												referindo-se à  americana -,  
												com igual firmeza, na 
												inadmissibilidade da intervenção 
												nas questõe internas de outros 
												estados, ou sustentou com maior 
												fervor, que os seus próprios 
												valores eram universalmente 
												aplicáveis". Nenhuma outra 
												nação, segundo ele,  "foi mais 
												pragmática na administração 
												cotidiana de sua diplomacia ou 
												mais ideológica na busca das 
												suas convicções históricas e 
												morais. Nenhum outro país 
												mostrou-se tão relutante em 
												envolver-se com outras nações, 
												mesmo quando assumia alianças e 
												compromissos de alcance e 
												objetivos sem precedentes".
											
												
 
											
												Imaginemos agora, se a sociedade 
												americana, ao contrário do que 
												Kissinger afirma, em seu livro, 
												que é, de fato, uma monumental 
												obra histórica da diplomacia 
												americana, admitisse intervenção 
												nas questões internas de outros 
												estados,ou que não sustentasse 
												que os seus próprios valores não 
												deveriam ser universalmente 
												aplicáveis!... 
											
												O que seria do mundo?...
											
												
 
											
												Mas ele continua: "As 
												peculiaridades que a América 
												atribuiu a si mesma, ao longo de 
												sua história, geraram duas 
												atitudes contraditórias, em 
												relação à política 
												internacional. A primeira é que 
												a América atende aos seus 
												valores através do 
												aperfeiçoamento da democracia em 
												casa, agindo, consequentemente, 
												como um guia para o restante da 
												humanidade; a segunda, que os 
												valores da América impõem sobre 
												ela própria a obrigação de 
												defendê-los em todo o mundo. 
												Dividida entre a nostalgia de um 
												passado incorrupto e o desejo de 
												um futuro perfeito, o pensamento 
												americano tem oscilado entre o 
												isolacionismo e o compromisso, 
												apesar do fato de, desde o fim 
												da Segunda Guerra Mundial, as 
												realidades de independência 
												terem predominado"
											
												
 
											
												Pessoalmente, Henry Kissinger 
												não dava noção de ser o que, na 
												realidade, era, quando o 
												conhecemos, em 1971, à entrada 
												do Salão Oval da Casa Branca, 
												nós, jornalistas brasileiros - 
												muitos dos quais já se foram, 
												como Carlos Castelo Branco, 
												Antônio Nasi Brum, Carlos 
												Machado Fehlberg (Secretário de 
												Imprensa da Presidência da 
												República),  e outros -, 
												encarregados da cobertura da 
												viagem do presidente Médici aos 
												EUA, a convite do presidente 
												Nixon.
											
												 
											
												Cordial, bem disposto e até 
												mesmo sorridente, Henry 
												Kissinger não nos negou um 
												rápido contato, advertindo, 
												porém, que nada falaria de 
												política, mas que gostaria de 
												nos dizer de sua grande 
												admiração pela Seleção 
												Brasileira de Futebol.  E que 
												considerava Pelé, um gênio da 
												bola, como não haveria nenhum 
												outro igual. E foi só!...
											
												 
											
												Logo, os dois presidentes 
												surgiram, na tribuna, para as 
												mútuas saudações oficiais, 
												quando Nixon, bastante 
												maquiado, para aparecer bem, na 
												televisão, proferiu, a frase 
												elucidativa, para aquele 
												momento: "Aonde for o Brasil, 
												irá todo o Continente Sul 
												Americano ". 
											
												E foi mesmo! A ditadura do 
												Brasil se alastrou por todo o 
												Continente.
											
 
											
												
												REYNALDO D. FERREIRA
											
												advogado, jornalista, escritor