Theresa Catharina de Góes Campos

 

Ser ou não ser: uma questão individual e intransferível


Por Raquel Souza
[1]

Em um mundo de constantes mudanças, faz –se relevante a compreensão do ser humano como ser de razão e propício às várias mudanças em proposição ao movimento da vida e da existência humana, tal como sua configuração no “todo” que o cerca e o constrói.

Pensar no humano é pensar na configuração das pessoas essencialmente como se entendem e se projetam, partindo de seus passados em função de suas motivações e do que traz sentido às suas vidas. É inviável se pensar em futuro, se não houver uma construção de passado sólida e motivações presentes que construirão o caminho almejado.

O homem é um ser “uno”, ou seja, único e singular. Logo, é absolutamente impossível taxar grupos de pessoas a partir de características comuns dessas, tanto pessoais, como sociais, tendo em vista que sendo diferentes, haverá mais incompatibilidades do que semelhanças. O ser humano não cabe em esquemas gerais, está muito além disso. Não são características comuns que agruparão as pessoas, tirando delas a individualidade que as fazem ser humanas.

No entanto, tudo que é visto atualmente, nos meios midiáticos, é as pessoas sendo rotuladas e/ou esteriotipadas através dessa ou aquela característica, ao invés de se buscar uma compreensão mais singular e aprofundada de cada um. O ser humano atual é objeto de gráficos e estatísticas governamentais e sociais, o que apresenta uma inversão de valores, em que sujeito de razão troca de lugar com o objeto de pesquisa. As pessoas já não são mais referenciadas pelos seus nomes, o fazem através de números, de forma a tirar a importância da humanidade do próprio ser humano; já não importa o que se é, importa –se apenas com a funcionalidade, com a serventia: “para que serve?”, configurando uma existência pragmática.

Cada pessoa só pode ser conhecida, externa ou internamente, a partir de ações externas dela mesma, observadas por terceiros.  Ações estas que perpassam as palavras, os gestos, as atitudes, os comportamentos, outros, de forma a apresentar-lhes ao ambiente externo e permitir que o outro as veja como são. Para tanto, é necessário compreender o outro enquanto existência, ou seja, perceber de algum modo, o sentido que ele mesmo dá à sua própria existência.

Uma pessoa não é essencialmente minada em si mesma, i.e, não se inicia e acaba nela mesma. As pessoas são um conjunto de partes, que reunidas, apresentam-se maiores que o todo externo, ou seja, o que se vê na imagem de alguém é muito pouco perto daquilo que de fato aquela pessoa representa e é. Elas se fundam numa espécie de intuição global e vivencial, ou seja, se  constróem e se projetam a partir de sua percepção de mundo e de sua bagagem de experiências.  A compreensão existencial de uma pessoa não pode ser dada a partir de uma simples análise de dados e de experiências, já que nenhum indício ou conjunto de características é suficiente para levar-nos à compreensão do outro.

O que tem prevalecido no âmbito existencial humano é a idéia de que o ser racional ignora as razões de sua vida e existência,  apresentando um comportamento paradoxal, e adota uma linha de mera sobrevivência, que descarta todos os motivos que a permeia. Se o que diferencia o ser humano dos outros animais, a grosso modo, é a racionalidade, e o mesmo tem optado por não usá-la, por julgar ser mais fácil não entender os porquês da sua própria vida, temos uma igualdade entre seres racionais e irracionais? A princípio poderíamos até pensar assim, mas só o fato de ter o poder de escolha, de ser ou não ser, de querer entender e compreender sua própria existência ou não, faz do homem maior que os outros animais.

Talvez o problema não esteja no indivíduo como parte, mas na realidade que se configura em sua volta e preenche as lacunas existenciais que o torneiam. Se o ser humano consiste em uma reunião de suas partes constituintes, que trazem consigo dados culturais, psicológicos, sociais, empíricos, familiares, religiosos, outros, pode-se pensar que a desconfiguração de algumas dessas partes gera um todo deste indivíduo também faltoso, incerto e impreciso.

Se o ser humano não nasce homem, torna-se ao longo de sua vida, e o movimento do vir a ser “humano”, depende, mesmo que em uma escala inferior à individual, das partes constituintes sociais, então o tornar-se humano ocorre no lugar social também, além do individual. Logo, boa parte dos problemas do ser humano é social. O que gera outro discurso paradoxal, ao entendermos a sociedade como uma constituição humana, em que cada indivíduo é parte fundamental. Será que o ser humano precisa ser protegido de si mesmo? Seus problemas estão fundados em sua própria existência e configuração externa dessa?

Voltando à racionalidade, se a construção individual e social de cada indivíduo advém dele mesmo, podemos, sim, afirmar que somos a raiz de todos os problemas que nos assolam. Ser ou não ser humano, racional, social, outros, depende apenas de nós mesmos. O ideal é, portanto, construir uma existência sólida e uma sociedade, ainda que com toda licença à subjetividade humana, segura de si.

A segurança, portanto, referenciada aqui, é aquela que abrange o individual e o social, que busca uma construção do todo, a partir da solidez das partes, das quais o ser humano é fundamental e fundamento, ao mesmo tempo, o que deixa bastante claro que toda a realidade existencial humana inicia-se no humano, fundamenta-se através do sentido de humanidade e busca o equilíbrio necessário à realidade social e individual humanas. Logo, o homem é o início, o meio  e o fim de si mesmo.

28/05/2007

Referências:

I- DOWELL, Mac. In apostila: A questão da racionalidade da fé. BH:   FAJE, 2007.

II- VAZ, Henrique C. de Lima. Escritos de Filosofia I: problemas de fronteira. SP: Loyola, 1998.

III- VAZ, Henrique C. de Lima. Ética &Direito. SP: Loyola, 2002.


[1] Graduada em Letras pela Pucminas; pós-graduanda em Arterapia em Educação pela UCAM/ RJ; graduanda em disciplinas isoladas em Filosofia pela FAJE/ MG; MBA em Gestão em Negócios (em andamento) pela UNOPAR- Contagem; professora de Língua Portuguesa da Rede Pitágoras, tutora universitária das graduações em Pedagogia, Normal Superior, Letras e Serviço Social e Coordenadora Educacional da UNOPAR- Contagem.

 

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