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								 BRASILEIRINHO 
								 
								(...) melhor mesmo é ir ao cinema para ver como 
								o finlandês, radicado no país desde 1990, Mika 
								Kaurismäki, sabe, em Brasileirinho,usando 
								linguagem documental de muito bom gosto, 
								valorizar o choro, um dos gêneros musicais mais 
								autênticos do Brasil. 
								 
								Kaurismäki já havia realizado antes um 
								documentário inesquecível, Moro no Brasil, 
								em que fazia um levantamento da riqueza e da 
								variedade rítmicas que encontrara no país desde 
								que aqui chegara, deixando de vez a sua terra 
								natal, a friorenta, mas igualmente bela 
								Finlândia. Não se sabe se, de forma 
								providencial, ele, contudo, se esquecera de 
								incluir, naquele levantamento, o choro, mais 
								antigo que o samba, antecedido apenas pelas 
								xácaras e pelas modinhas dos tempos imperiais. 
								 
								No intuito de suprir essa deficiência do 
								documentário anterior, Kaurismäki decidiu rodar 
								o Brasileirinho para nele narrar a 
								história do choro, pois fora alertado, nesse 
								sentido, por Marco Forster, que se ofereceu para 
								colaborar no roteiro e produzir o filme. É 
								preciso advertir, porém que se trata de um 
								documentário sobre música, com pouca coisa sobre 
								os intérpretes – instrumentistas e cantores -  
								que, por sua vez, não derramam lamúrias, nem 
								usam verborragia rasteira, como sói acontecer em 
								outros do gênero, produzidos no país. 
								 
								A linha expositiva de Kaurismäki, que também 
								assina o roteiro, se baseia nas apresentações do 
								Trio Madeira Brasil -  constituído por Marcello 
								Gonçalves (diretor musical do filme), Zé Paulo 
								Becker e Ronaldo Souza -, que quase sempre se 
								faz acompanhar por outros instrumentistas, como 
								Hamilton de Holanda, Joel do Bandolim, Jorginho 
								do Pandeiro, os rapazes da Banda de Cordeiro, no 
								Estado do Rio,  e por cantoras como Elza Soares, 
								Zezé Gonzaga, Ademilde Fonseca e Teresa Cristina 
								. É interessante notar que Marcello e Zé Paulo 
								são acadêmicos, egressos da música erudita, mas 
								que, na humildade, como dizem, foram aos botecos 
								a fim de aprender as particularidades da música 
								popular brasileira. E como aprenderam!... E não 
								só isso, pois trouxeram do meio o terceiro 
								integrante do conjunto, Ronaldo Souza. 
								 
								A história do choro, porém é contada, no filme, 
								pelo saxofonista/clarinetista Paulo Moura, pelo 
								violonista, Yamandu Costa e pelo compositor 
								Guinga, com intervenções do trombonista Zé da 
								Velha, de Luciana Rabello -  que mantém, com 
								Maurício Carrilho, uma escolinha no Alto da 
								Glória - e do trompetista Joatan Nascimento. De 
								Paulo Moura, que costuma lacrimejar os olhos 
								enquanto toca seus instrumentos preferidos, há o 
								reconhecimento de que a inspiração lhe vem ao 
								ver alguém dançando à sua frente, pois, como 
								observa, o ritmo brasileiro atua principalmente 
								sobre as cadeiras, fazendo-as gingar, mais que 
								quaisquer outras partes do corpo. 
								 
								Por sua vez, Yamandu Costa, originário do Rio 
								Grande do Sul, trata o choro, no seu violão de 
								sete cordas, com técnica e seriedade tais, que 
								leva a gente às vezes a acreditar ser sua 
								pretensão fazer algo que se assemelhe ao que 
								fazia Astor Piazzola com o tango, o qual também 
								se originou de uma mistura de sons africanos e 
								europeus. Por sinal, um dos momentos mais 
								empolgantes do filme é quando Yamandu toca 
								Carinhoso, de Pixinguinha - em cuja data de 
								nascimento, 23 de abril, se comemora o Dia do 
								Choro -, no Teatro Municipal de Niterói, com 
								todo o público cantando: Meu coração/ não sei 
								por que/ bate feliz/ quando te vê... 
								 
								Outra bela música, executada no filme, é 
								Senhorinha, de Guinga, que teria surgido 
								numa fase em que ele, segundo suas palavras, 
								queria jazzificar o choro. A aproximação do 
								choro com o jazz, entretanto, quem faz é Zé da 
								Velha, que afirma: O choro é o jazz 
								brasileiro. Não há dúvida. Ambos têm as mesmas 
								características.  Uma dessas 
								características, conforme destaca Joatan 
								Nascimento, é a improvisação. Mas, como ele 
								observa, a improvisação no choro não é 
								exatamente a que se faz no jazz. No choro, a 
								improvisação tende mais para a variação, 
								conforme explica, o que a tornaria, a seu ver, 
								mais difícil para o instrumentista fazer. 
								 
								Além desses aspectos, vale observar o cuidado de 
								Kaurismäki em aproveitar belos cenários do Rio 
								de Janeiro para criar ambiente, tanto para os 
								números musicais, como para os depoimentos dos 
								instrumentistas e cantores. Ademilde Fonseca, 
								por exemplo, explica para Zezé Gonzaga e Teresa 
								Cristina como se tornou pioneira na introdução 
								de letras no choro – Tico-Tico no Fubá, 
								de Zequinha de Abreu -  numa varanda, cuja 
								parede exibe pintura de guirlandas de flores. 
								Mas é notável o efeito que a fotografia de 
								Jacques Cheuiche  tira dos Arcos Romanos da 
								Lapa, das escadarias da Igreja da Penha e 
								principalmente do edifício do Real Gabinete 
								Português de Leitura, os quais compõem cenários 
								magníficos para as rodas de choro, lideradas 
								pelo Trio Madeira Brasil e com a participação 
								ainda de inúmeros dançarinos. 
								 
								O que se há de lamentar é, em primeiro lugar, 
								que Brasileirinho, embora realizado em 
								2005, só agora chegue aos nossos cinemas após 
								haver sido exibido no mundo inteiro, até mesmo 
								no Festival de Berlim, pois encontrou 
								dificuldades – elas sempre existem e muitas aqui 
								principalmente se for para divulgar o nosso 
								acervo cultural – a fim de resolver questões 
								relativas a direitos autorais de músicas 
								incluídas no filme. Em segundo lugar, é que, 
								embora o documentário tenha o nome do famoso 
								chorinho de Waldir Azevedo, Brasileirinho, 
								que deveria ser o tema principal, não o é. Seria 
								também problema de direito autoral?... De 
								qualquer forma, vale a pena ver o envolvente 
								filme de Kaurismäki e esquecer, por noventa 
								minutos, tudo o que de lastimável acontece nesta 
								decadente República. Bravo!... 
								 
								REYNALDO DOMINGOS FERREIRA 
								ROTEIRO, Brasília, Revista 
								 
								
								
								
								www.theresacatharinacampos.com 
								
								
								
								www.arteculturanews.com 
								
								
								
								www.noticiasculturais.com 
								
								
								
								www.politicaparapoliticos.com.br 
								
								
								
								cafenapolitica.blog.br 
								FICHA TÉCNICA 
								BRASILEIRINHO 
								Brasil/Suíça/Finlândia – 2005 
								Duração – 90 minutos 
								Direção – Mika Kaurismäki 
								Roteiro – Mika Kaurismäki e Marco Forster 
								Produção – Marco Forster, Bruno Stroppiano e 
								Mika Kaurismäki 
								Fotografia – Jacques Cheuiche 
								Direção Musical – Marcello Gonçalves 
								Edição – Karen Harley 
								 
								Elenco – Paulo Moura, Marcello Gonçalves, Zé 
								Paulo Becker, Ronaldo Souza, Yamandu Costa, 
								Ademilde Fonseca, Zezé Gonzaga, Teresa Cristina, 
								Elza Soares, Guinga, Zé da Velha, Joatan 
								Nascimento, Joel do Bandolim, Silvério Pontes, 
								Hamilton de Holanda, Luciana Rabello, Maurício 
								Carrilho, Fred Dantas e Carlinhos Leite.  | 
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