Theresa Catharina de Góes Campos

  ACIDENTE EM XAVANTINA


Ao descermos do pequeno pássaro,
o Cessna diminuto no céu imenso,
soubemos que precisaríamos trabalhar
com menos recursos do que habitualmente.
Não poderíamos contar com veículo algum,
desta vez, para nosso transporte e dos materiais.
Deveríamos, desta vez, nos movimentar
sem a ajuda do jipe e do caminhão.


Fui a primeira a indagar
o porquê da situação
ainda mais precária
do que as condições
de costumeira escassez
dos recursos mínimos.


Esperava uma resposta
com desculpas meio absurdas,
nada objetivas, enfim,
eu não estava aceitando mesmo
a ausência do jipe e do caminhão,
os únicos veículos da localidade.


No entanto, a informação que
de pronto me transmitiram
deixou-me boquiaberta...
antes de explodir em risadas,
sem acreditar mesmo na
história que me pareceu
de todo mirabolante.
Até imaginei ser um trote, uma brincadeira
para enganar a jornalista recém-formada.


Quando insistiram no "causo"
estranho, inusitado, quase surreal,
voltei às minhas risadas...
Quando eu conseguia falar,
perguntava: mas como isso aconteceu?
Não há trânsito aqui!
Apenas dois veículos circulam,
os únicos de Xavantina:
o jipe e o caminhão!
Como podem ter se chocado?
Os motoristas estavam cegos?
Estariam dormindo, cansados?


Tranqüilos, bem tranqüilos,
na maior calma do mundo,
com toda a naturalidade,
confirmaram: o choque ocorreu
porque ambos os motoristas
dirigiam em alta velocidade,
ambos sabendo serem os únicos
existentes em Xavantina,
pensando ambos, igualmente,
que não encontrariam o outro veículo.
Acharam ambos que não haveria
tal possibilidade de perigo...
Aliás, saíram com ferimentos leves
do acidente para eles inesperado,
mas os veículos ficaram inoperantes,
porque bastante danificados.


Consegui parar de rir,
diante de tal absurdo,
passando a reclamar
de tamanha irresponsabilidade.


Assim, não houve outro jeito:
fomos caminhando todos...
com a nossa bagagem pessoal
e materiais de trabalho,
e os atenciosos funcionários
da Fundação Brasil Central
auxiliando a levar outros volumes,
uma carga preciosa porque útil,
tão esperada e necessária.
Todos (menos eu, apenas conformada
porque não havia alternativa)
muito resignados, pacientes, tranqüilos,
tudo encarando com a maior naturalidade,
no seu contexto habitual de carências e absurdos.


Theresa Catharina de Góes Campos
Xavantina (desde 3/3/1980, Nova Xavantina) - Mato Grosso, 1966.

From: Luci Tiho Ikari
Date: 2008/12/31
Subject: Re: cd-poesias)ACIDENTE EM XAVANTINA - Theresa Catharina de Góes Campos
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Olha só!
Quanto descuido de ambas as partes, num lugar sem trânsito. E, que coincidência, einhn!
É um alerta para nós. Obrigada! Luci

 

Jornalismo com ética e solidariedade.