Theresa Catharina de Góes Campos

  KATYN

O cineasta Adrzej Wajda, aos oitenta e um anos, imprime
extraordinário vigor narrativo a Katyn – uma obra-prima - para mostrar
como ocorreu a execução, numa floresta russa, de oficiais militares e
de cidadãos poloneses, num total aproximado de 22 mil pessoas,
ordenada por autoridades soviéticas, após a invasão da Polônia em
1939.

Com base no livro Post Mortem – The Story of Katyn, de Andrzej
Mulbarcyk, Wajda pinta, na verdade, um grande painel sobre as
atrocidades sofridas por seu povo, sob o domínio, a partir de setembro
daquele ano, primeiro, dos nazistas e, em seguida, dos comunistas, que
o sufocaram até 1989, quando, afinal, a Polônia recuperou sua
soberania.

Do ponto de vista técnico, é perceptível a intenção dos
roteiristas – Mulbararcyk, Wajda e Przemlykavy Nowakowski – de enfocar
vários temas relacionados com o massacre de Katyn sob a visão das
mulheres que perderam maridos e filhos nos terríveis acontecimentos.
Do ponto de vista político, o filme deixa evidente que havia mútua
colaboração, entre nazistas e comunistas, visando à partilha entre si
do território polonês e sua posterior subjugação aos comandos de
Hitler e de Stalin.

Há uma imagem forte, metafórica, quase ao início da película,
quando a câmara de Pawel Edelman focaliza, na parede de uma igreja
rural, um crucifixo despojado da imagem, pois, a cruz sustém apenas o
braço amputado de Cristo. O corpo é identificado, em seguida, no
campo, velado por um sacerdote, em meio a inúmeros outros de soldados
poloneses dizimados pelas forças nazistas.

O protagonista é Andrzej (Artur Zmijewski), um jovem capitão da
infantaria, que, aprisionado pelos soviéticos, segue para Katyn, numa
troca incidental de identidade por usar o suéter, a fim de se proteger
do intenso frio, com o nome de um colega de farda, Jerzy (Andrzej
Chyra), o convocado.

Antes de Andrzej se tornar prisioneiro, a mulher, Anna (Maja
Ostezewska), acompanhada da filha Weronica (Wiktoria Gaziewskz), fora
ao acampamento, onde ele se encontrava, a fim de lhe pedir, alucinada,
que desertasse. Ele alegara, contudo, o compromisso que tinha com o
exército polonês, ao que ela retrucara: - Mas antes você tem
compromisso comigo, com o nosso casamento!...

Anna, porém, tem esperança de que Andrzej tenha escapado, pois
seu nome não consta da lista divulgada. Por imagens documentais usadas
com muita competência por Wajda, pontuadas pela música sublime de
Penderecki, tem-se então noção precisa das informações forjadas pelos
soviéticos para acusar os nazistas pelo massacre ocorrido nos
arredores do vilarejo de Katyn, situado nas cercanias da cidade russa
de Smolensk, que se localiza a 560 km da atual fronteira da Polônia.

A mãe de Andrzej (Maja Komorouska), contudo, mesmo sabendo que o
nome do filho não consta da lista dos convocados, não se engana. Ela,
ao contrário de Anna, a nora, tem nítida noção de que perdera também o
filho, como o marido, professor Jan (Wladislaw Kowalski), que fora
eliminado, assim como todo o corpo docente da universidade de
Cracóvia, por determinação das autoridades nazistas.

A dúvida permanece, porém, até que surge Jerzy, que sobreviveu
ao massacre e aderiu aos soviéticos, inscrevendo-se no Exército do
Povo da Polônia, para comunicar à família a morte do companheiro e lhe
trazer, de presente, dois vidros de conservas. Paralelamente a esse
fato, Roza (Danuta Stenke), viúva do General (Jan Englert), recebe das
mãos de uma ex-empregada a espada do marido, morto também em Katyn. E
um jovem idealista, Tadeusz (Antoni Pawlicki), estudante, que fizera
questão de mencionar, na ficha de inscrição na escola de belas artes,
ser filho de uma vítima do massacre, é brutalmente assassinado por
soldados soviéticos nas ruas centrais de Cracóvia.

Wajda, nesse belo trabalho antibélico, dedicado à memória do seu
pai, Jakob Wajda, que sucumbiu também no genocídio perpetrado por
agentes da NKVD (antecessora da KGB), continua fiel aos seus preceitos
de fazer cinema, desde que se tornou mundialmente conhecido, na década
de cinqüenta do século passado: liberdade formal, respeito às
tradições polonesas e complexidade psicológica das personagens.

Além disso, como Jerzy Kawalerowicz (Madre Joana dos Anjos), de
sua mesma geração, Wajda, detentor do Oscar Honorário da Academia de
Hollywood, é um grande diretor de atores, tendo sido o responsável
pelo lançamento de, entre outros, Zbingnew Cybulski, inesquecível
intérprete de Cinzas e Diamantes, morto ainda muito jovem, mas que
alcançou enorme popularidade na Polônia nos anos de 1960.

Wajda, em Katyn, confiou os papéis femininos, que sustentam a
narrativa, a atrizes de muita têmpera dramática. A primeira delas, é
Maja Komorouska, mãe de Andrzej, que tem atuação discreta, mas
exemplar. Maja Ostesewska representa o papel de Anna, mostrando que,
muitas vezes, um ato psicológico exige ações físicas precisas para se
expressar. É nisso que ela baseia sua estupenda atuação. E Danuta
Stenke, na interpretação do papel de viúva do General (Jan Englert),
demonstra que, além de ser uma mulher elegante e bonita, é uma atriz
de apurada técnica teatral.

O elenco masculino também não poderia ser melhor, integrado por
atores da categoria de Artur Zmijewski, Jan Englert e Wladislaw
Kowalski. Mas o papel de maior destaque, dada a complexidade da
personagem, é inegavelmente o de Andrzej Chyra – um dos intérpretes
mais requisitados atualmente do cinema polonês - , brilhante como
Jerzy, que, embora tenha sobrevivido ao massacre, não consegue viver
da mentira, isto é, em conivência com os assassinos. Como o jovem
Tadeusz, ele prefere morrer pela verdade.

REYNALDO DOMINGOS FERREIRA

ROTEIRO, Brasília, Revista
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KATYN
Polônia, Rússia e Alemanha/2007
Duração – 118 minutos
Direção – Andzej Wajda
Roteiro – Andrzej Mulbacyrki, autor do livro Post Mortem – The Story
of Kartyn, Andrzej Wajda e Przemzylikavi Nowarowski
Produção –Michal Kwiecinski
Fotografia – Pawel Edelman
Música – Krzystof Penderecki
Elenco – Artur Zmijewski (Andrzej), Andrzej Chyra (Jerzy), Maja
Komorouska (Mãe), Danuta Stenke (Roza), Maja Ostezewska (Anna), Wiktoria Gaziewski (Weronica), Wladislaw Kowalski (professor Jan), Jan Englert (General), Antoni Pawlicki (Tadeuzs)
 

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