Theresa Catharina de Góes Campos

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Diploma de Jornalista II

*Antônio Álvares da Silva

Depois da decisão do STF sobre a desnecessidade de diploma para o
exercício da profissão de jornalista, uma discussão paralela vem
mobilizando a atenção de alguns juristas, embora desconhecida do
grande público: pode o Congresso fazer lei exigindo o diploma,
contrariando o que foi decidido no Supremo?

A questão é do mais alto interesse e envolve grande indagação de
Direito Constitucional. Pela Constituição brasileira, o STF é o seu
guardião. Cumpre-lhe defendê-la das agressões do legislador, da
Administração Pública e até dos particulares. Esta é sua finalidade
precípua e é para isto que existem tribunais e cortes constitucionais
em todos os países. Se a Constituição é violada, quebra-se a
hierarquia do ordenamento jurídico e deixa de existir o respeito às
leis, responsável pela ordem social e pelo estado de direito.

Mas, também, está na Constituição que cabe ao Congresso Nacional
(Câmara dos Deputados e Senado Federal) legislar sobre todos os
assuntos de interesse do povo. Se ao Supremo é dada a competência para
interpretar, ao Congresso é outorgada a competência para criar a
norma. Todo e qualquer assunto, respeitada a Constituição, a ética e a
moral vigentes e os princípios da cultura jurídica universal, pode ser
objeto de lei e transformar-se em norma vigente na sociedade
humana.

Se o STF declara uma lei incompatível com a Constituição, exerce sua
função autêntica e prioritária. Do mesmo modo, o Congresso, quando
cria a lei. Se ela é julgada inconstitucional, pode o Parlamento
repeti-la? Eis a questão.

Alguns ministros do Supremo e outras autoridades federais (por
exemplo, o Advogado Geral da União) vêm afirmando que o assunto está
encerrado e o legislador não pode mais exercer sua competência
legislativa sobre o tema.

Esta afirmativa é errada e não se sustenta perante a lógica jurídica.
A Constituição afirmou que - "é livre o exercício de qualquer
trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações
profissionais que a lei estabelecer" - art. 5º, XIII.
Portanto garantiu a liberdade de escolha e o exercício de qualquer
profissão, mas deu também ao legislador a faculdade de estabelecer
"qualificações profissionais", considerando as exigências técnicas,
sociais e políticas de determinados profissionais.

O STF entendeu que a profissão de jornalista é livre, não estando
sujeita à "qualificação profissional". Portanto julgou contra a
Constituição, que permite ao legislador fixá-la. O Decreto-Lei 972/69,
certo ou errado, impôs a exigência do diploma e foi recepcionado pela
Constituição atual, pois em nada a contraria. Pelo contrário, revigora
sua exigência de estabelecer qualificações profissionais.

Se o STF entende o oposto, pode a interpretação ter prioridade sobre a
legislação? A resposta é negativa. Não pode. Se a lei é, pela via
interpretativa, contrária à Constituição e se o Congresso entender
diversamente, pode ele perfeitamente fazer nova lei que predomine
sobre a orientação do Supremo. Caso contrário, o Judiciário passaria a
ter mais força que o legislador. E estaria subvertido o mandamento de
harmonia e independência entre os Poderes do Estado.

E note-se que não é sequer necessária emenda constitucional. Basta uma
lei ordinária. Entre quem faz a Constituição e quem a interpreta, a
predominância é do primeiro, em caso de conflito. Normalmente, o
legislador não reedita lei considerada inconstitucional. E está certo,
pois assim evita o conflito entre Poderes. Mas, se entende o
contrário, tem plenos poderes para corrigir a interpretação que
considera errada do Judiciário e impor a norma que entende correta.

O legislador é eleito pelo povo. E é dele, e não dos juízes, que emana
todo e qualquer Poder dentro de um Estado democrático. A vontade
popular é o fundamento da democracia representativa. É a sua força
básica e o limite de sua ação. Se a vontade popular é contrariada, o
regime não é mais democrático, pois resvala para o campo do arbítrio e
da usurpação.

Ainda resta esperança aos jornalistas, se sua justa causa pelo diploma
for encampada pelo Congresso Nacional.

*Professor titular da Faculdade de Direito de Minas Gerais e juiz do trabalho
 

Jornalismo com ética e solidariedade.