Theresa Catharina de Góes Campos

  22 de Julho de 2009

A COBRANÇA POR PONTO EXTRA DA TV A CABO

www.fenaj.org.br

Ponto extra reflete crise do setor de TV por assinatura

A polêmica cobrança pelo ponto extra de TV por assinatura ganhou outro
capítulo. As empresas prestadoras do serviço encontraram uma lacuna na
atual legislação, que lhes permite exigir dos assinantes o pagamento
pelo aluguel do equipamento decodificador do sinal adicional. A NET
foi primeira empresa a anunciar a nova modalidade. Para o Fórum
Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), a cobrança reflete
a atual crise regulatória do setor e onera, indevidamente, os
assinantes.

A cobrança do ponto extra foi proibida pela Agência Nacional de
Telecomunicações (Antel) no final de 2007, quando criou o Regulamento
de Proteção e Defesa dos Direitos dos Assinantes do Serviço de TV por
Assinatura, por intermédio da Resolução nº 488/2007. A medida provocou
um intenso debate entre os consumidores e as empresas prestadoras do
serviço e tornou-se alvo de disputas judiciais. Em abril deste ano,
após consulta pública, a Agência lançou a Resolução nº 528/2009,
ratificando a proibição mensal e contínua do ponto adicional.
Entretanto, a norma autoriza as empresas a cobrarem pela instalação e
reparos da rede interna e dos conversores, dando margem às prestadoras
para cobrar o aluguel dos equipamentos.

Para Celso Schröder, coordenador-geral do FNDC, a mudança da regra
contradiz uma posição tomada anteriormente pela Anatel. “Isso é um
problema para uma agência reguladora. A Anatel vem sinalizando para um
tipo de regulação, e, de uma hora para outra, interpreta a legislação
de outra maneira, acolhendo de forma unilateral a posição das
operadoras de TV por assinatura”, adverte.

Questionado sobre a cobrança, o Superintendente de Comunicação de
Massa da Anatel, Ara Apkar Minassian, informou que o órgão ainda não
foi comunicado oficialmente. Contudo, ressaltou que a Agência
“regulamenta o serviço e não os equipamentos”, logo, não tem como
legislar sobre a cobrança de aluguel dos conversores.

Alexandre Annenberg, presidente da Associação Brasileira de TV por
Assinatura (ABTA), argumenta que a programação é cobrada apenas pelo
ponto principal, ou seja, por domicílio, mas que “a operação se paga
por quantos forem os pontos que acessam a rede. Assim, se houver mais
de um ponto, o assinante vai pagar os valores relativos aos custos
operacionais”, explica.

Consumidores são reféns
A advogada do Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), Estela
Guerrini, acredita que a cobrança do ponto extra não tem sentido, uma
vez que o assinante já paga mensalmente para receber o serviço. Para a
o Instituto, a cobrança de um “aluguel” só teria validade se fosse
possível adquirir o decodificador no mercado. “O consumidor é refém
das empresas. Não se encontra no mercado um equipamento homologado
pela Anatel, e se, por acaso, existir, dificilmente a operadora vai
querer ativar seu sinal em outro aparelho que não o dela. O consumidor
acaba preso à empresa”, aponta.

De acordo com Guerrini, as prestadoras nunca cobraram pelo
decodificador, “sempre cederam em forma de comodato ou por
empréstimo”. Isso porque, ressalta a advogada, para contratar
plenamente o serviço de TV por assinatura, o decodificador é um item
indispensável. “Sem ele, o consumidor não consegue ter acesso ao sinal
daquela prestadora. Então, pagar além por algo que é indispensável
para a prestação do serviço não faz muito sentido”, argumenta. No caso
específico da NET, Guerrini acredita que a empresa finalmente aceitou
a proibição da cobrança pelo ponto extra, mas, em contrapartida
resolveu cobrar o aluguel dos aparelhos.

A advogada avalia ainda que há outro problema atrás da polêmica do
ponto extra – a pouca concorrência no setor. “A Anatel precisa
enfrentar essa questão. A concorrência é uma das formas de garantir
benefícios para os consumidores quanto à qualidade da programação, do
serviço e dos preços. Mas no Brasil, ela não existe nesse setor, basta
vermos os altos valores cobrados pelas prestadoras”, expõe.

Empresas consideram a cobrança justa
Embora não fosse regulamentado pela Anatel, o valor cobrado pelo ponto
extra era, em regra, proporcional ao custo total do plano. “Algo em
torno de 20%. Se o plano fosse de R$ 100,00 o ponto adicional teria um
custo de R$ 20,00”, aponta Guerrini. Annenberg esclarece que esses 20%
correspondem aos custos operacionais e os 80% à programação. “Nós
nunca cobramos pelo conteúdo no ponto extra e sim pela operação do
sistema”, reforça o empresário.

“As pessoas fazem analogia com uma rede telefônica, em que não se paga
nada por uma extensão. Logo, não vêem porque pagar pela extensão de TV
a cabo. Mas os sistemas são distintos. O ponto extra na TV por
assinatura funciona independentemente do principal, o que justifica a
cobrança”, pondera o presidente da ABTA.

Ainda segundo Annenberg, para compreender quais são esses custos
operacionais é preciso entender a topologia de uma rede de TV por
assinatura. Diferentemente da telefonia, que apenas conecta dois
pontos, a rede de TV a cabo é um anel onde circula permanentemente
todo o conteúdo do sistema. Ele explica que esses conteúdos são
acessados através de células e cada uma delas é dimensionada para
atender aproximadamente dois mil pontos, independentemente de serem
extras ou principais. Quando aumenta o acesso, surge a necessidade de
mais células e é preciso implementar ao longo da rede mais
amplificadores, equipamentos e sistemas de monitoramento, de forma a
garantir a qualidade e a uniformidade do sinal.

Annenberg argumenta que a única forma de não cobrar o ponto extra, é
diluir seus custos sobre a rede e embuti-los no ponto principal. Tal
medida aumentaria o valor do serviço e “prejudicaria aqueles
consumidores que possuem apenas um ponto, que geralmente são pessoas
de menor poder aquisitivo. Ou seja, é uma situação absurda do ponto de
vista lógico”. O presidente destaca que a proibição da cobrança criou
uma situação “muito complexa para os operadores, porque interveio num
modelo de negócio estabelecido há mais de vinte anos”.

Modelo de negócio está em crise
Na avaliação de Schröder, no setor de TV por assinatura “as regras não
são claras, o serviço prestado não é de qualidade, o consumidor não
tem possibilidade de decidir sobre o conteúdo e isto produz um modelo
de negócio visivelmente deficitário”. Segundo o jornalista, “as
empresas não conseguiram, ao longo desses anos, uma alternativa de
negócios mais rentável. A Anatel percebe que o modelo está em crise,
no entanto, em detrimento da população, atende ao mercado e isso é um
equívoco. Não podemos resolver essas deficiências simplesmente
onerando o consumidor”.

Para o jornalista, os problemas inerentes ao modelo são resultados do
não cumprimento do que diz a Lei do Cabo. “O conceito de rede pública
e única, que potencializava tanto a desagregação de redes e serviços
quanto a universalização do acesso não se concretizou. Por outro lado,
o controle público não existe. Se estes dispositivos fossem aplicados
teríamos uma outra realidade de mercado”, acredita. Para Schröder, os
pacotes e conteúdos oferecidos devem ser qualificados, o consumidor
dever ter autonomia para escolher os canais, os preços precisam ser
compatíveis com as possibilidades e com o grau de universalização do
serviço.

Candice Cresqui – da Redação do FNDC
 

Jornalismo com ética e solidariedade.