Theresa Catharina de Góes Campos

  SOBRE A IMPORTÂNCIA DO USO DE ADJETIVOS

Rejeito as restrições que alguns fazem ao uso dos adjetivos...porque
não aceito tais conselhos rígidos, sem a flexibilidade necessária,
para as redações em vestibulares e concursos. Na verdade, rejeito a
tentativa de se promover uma uniformização sem sentido, para fazer
todos escreverem da mesma forma, com estilo idêntico, sem
originalidade ou criatividade na elaboração dos textos que não são
técnicos.

Até enxergo uma certa "injustiça" contra a presença dos adjetivos,
no ato de falar e escrever, considerando que nos ajudam a qualificar o
que precisamos expressar, inclusive representando um posicionamento do
autor (quando não há uma situação que exija qualquer necessidade de
ser impessoal ou imparcial).

Essa escolha de vocabulário revela conhecimento semântico,
etimológico, e portanto, vem do hábito de leitura e dos estudos
gramaticais. A decisão por um adjetivo demonstra capacidade de análise
e interpretação (hermenêutica); o seu emprego indica resposta a uma
atitude, também filosófica, de questionamento (maiêutica).

Evidentemente, se tudo isso se aplicar com propriedade na escrita em
prosa e na forma oral...
porque no reinado da poesia a liberdade é muito maior, com outras
justificativas, ligadas à métrica, às rimas, à proposta de expressão e
ao tipo de poema (trova, soneto, haicai, poesia clássica, tradicional,
barroca, parnasiana, simbolista, modernista, concretista ou
representando diversas escolas literárias), penso que mais argumentos
não preciso dar, para me declarar a favor dos adjetivos.

Que sejam muito bem-vindos à nossa vida!

Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília-DF, 17 de agosto de 2009.

From: Tereza Lúcia Halliday
Date: 2009/8/19
Subject: Re: SOBRE A IMPORTÂNCIA DO USO DE ADJETIVOS
To: Theresa Catharina de Goes Campos


Apoiadíssimo, Therezita.
Um beijo, Tereza Lúcia


From: Ana Falcão
Date: 2009/8/19
Subject: Re: SOBRE A IMPORTÂNCIA DO USO DE ADJETIVOS
To: Theresa Catharina de Goes Campos

Estimada Theresa,
Considero oportuníssima sua defesa do adjetivo, tão desprezado por
quem pretende ter a incumbência de ensinar receita de redação para
vestibular e concursos.
Pergunto: por que essa classe tão classuda existiria em todas as
línguas se não fosse necessária?
Em resumo, observo que há duas espécies de adjetivos: os explicativos
e os qualificativos.
Ao escrever, deve-se perguntar a finalidade do texto. Recomenda-se que
um documento oficial seja bastante enxuto, objetivo, e até curto,
para que as autoridades, ou seus assessores, tão ocupados, se dignem a
lê-lo em meio a uma enorme quantidade de papéis ou de e-mails.
Trata-se de uma questão de oportunidade e praticidade. Nesse caso, o
adjetivo qualificativo é, na maioria das vezes, dispensável. É bom
lembrar que o "Manual da Presidência" aboliu o fecho "respeitosas
saudações", de triste memória e ainda cultuado pelos saudosistas.
Substituiu-o por "respeitosamente" ou "atenciosamente", conforme a
hierarquia.
No entanto, em um documento oficial, devem-se usar os explicativos,
sem os quais o texto ficaria sem entendimento. Uma pesquisa mais
detalhada levaria, igualmente, ao emprego de qualificativos, como
"urgente", "obrigatório", importantes de acordo com o contexto.
Não me parece correta a fórmula que não contextualiza.
Há textos e textos.
A esse propósito, tentei ler, sem adjetivos, o excelente comentário
do amigo Reynaldo Domingos Ferreira sobre o filme "O Grupo Baader
Meinhof".
Nele percebemos muitos explicativos - técnico, marxista-leninista,
homônimo, terrorista, melhor, psicopata, direitista, mental, político
- e outros qualificativos - notável, grande, autêntico, sequiosa,
jornalístico, claro, desiludida, bela, forte, duro, alta, excepcional,
perfeita, vidrados, violentos, rica, histórico, sonora.
A leitura, retirados esses modificadores que acrescentam uma
qualidade, uma característica, uma extensão aos seres, objetos e
noções, ficaria sem significado nem emoção.
Afinal, para expressar uma opinião, esses ingredientes, aliados à
competência do crítico, se fazem imprescindíveis.
Abraços
Ana
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NOTAS DA EDITORA:

Receber um texto como o que nos enviou Ana Falcão é mesmo um
privilégio para qualquer editor. Uma aula resumida, mas objetiva,
ministrada com muita clareza e concisão de argumentos. Para ser
transcrita na íntegra e assim divulgada.

Theresa Catharina
Brasília-DF, 20 de agosto de 2009.


From: REYNALDO FERREIRA
Date: 2009/8/20
Subject: RE: SOBRE A IMPORTÂNCIA DO USO DE ADJETIVOS
To: Theresa Catharina Campos


Prezada Theresa Catharina,
Obrigado pela mensagem. Você e a Ana estão cobertas de razão.
Realmente, como indaga a Ana, se não fossem necessários, por que
existiriam os adjetivos em todos os idiomas? O nosso é rico, bonito e
majestoso. Mas a mentalidade da nossa gente é estreita, tacanha e
preguiçosa. Principalmente a dos nossos gramáticos, como já dizia na
década de cinquenta do século passado, o meu professor de português,
Santino Gomes de Matos. Ainda há pouco, recebi diversas reprimendas -
e até mesmo correções no meu texto, reproduzido em alguns sites -
porque preferi usar o termo "assaltador" para qualificar Dillinger.
Assaltador, como registram os bons dicionários, é o mesmo que
assaltante. Só que, no meu entendimento, o termo expressa melhor
aquele que planeja um assalto e não age sozinho. Houve a alegação de
que o termo é pouco usado e que, por isso, eu deveria trocá-lo por
assaltante. Então, pelo simples fato de ser pouco usado, eu não
deveria usá-lo?...E a preocupação de Guimarães Rosa, que percorreu os
sertões das Minas Gerais à procura de termos desusados guardados pela
gente tradicionalista mineira, como ficaria nessa história? Por que
exaltam tanto Guimarães Rosa, cultor de uma verborragia rançosa, mas
rica, bonita e poética? Enfim, para não dar muita prosa a essa gente
desocupada, parafraseando Vieira, meu clássico de cabeceira, eu diria
a respeito desses gramáticos da indústria dos vestibulares
brasileiros: Os gramáticos e os fariseus são piores que o demônio. Mas
ainda virão outros piores que eles!... Meus elogios a você e à Ana,
grandes conhecedoras do nosso idioma. Forte abraço, Reynaldo


From: Theresa Catharina de Goes Campos
Date: 2009/8/20
Subject: Recebi o seu excelente texto, erudito e de personalidade...)
ref. SOBRE A IMPORTÂNCIA DO USO DE ADJETIVOS
To: REYNALDO FERREIRA


Estimado Reynaldo:

Eu não havia recebido antes o seu excelente texto, erudito e de
personalidade no estilo e na força das palavras escolhidas, marcas de
todos os seus escritos! Que bom você ter me indagado e, ainda, se dar
ao trabalho de procurá-lo e reenviar para mim - com tantas
informações... e até uma denúncia, bastante necessária, dos que buscam
"fama" não com o trabalho honesto, e sim, "gritando" sobre
inexistentes erros dos que estudaram e continuam praticando a arte de
bem escrever.

Como você sabe, para valorizar os textos que gentilmente me enviam,
tenho o hábito de revisá-los, apenas para verificar com referência a
alguns deslizes na digitação - um problema eventual, embora comum a todos nós. Quando não entendo uma expressão usada pelos autores, ou a construção de uma frase, costumo me comunicar com eles, para indagar e ser esclarecida, antes de fazer a divulgação, o que não seria ético e, por isso, inaceitável.

A pressa para divulgar, sem consultar quem escreveu o original, não
se justifica. Quanto à agressividade, descortesia e desrespeito, dos
que se apressam a publicar críticas sem fundamento, nascidas da
ignorância, nunca foram argumentos...assim, na maioria das vezes, nem
merecem resposta. Seria como responder a uma provocação intencional,
prolongando a tal "fama"...

Em inúmeras ocasiões comprovo, me dirigindo aos autores, que a minha
dúvida nasceu de ignorar um conhecimento mais profundo, quiçá
erudito, logo expressando meus agradecimentos pelo aprendizado e
aperfeiçoamento.

Voltando às suas palavras, Reynaldo, bastante atuais, também
divulgarei na íntegra, não apenas junto com o meu pequeno comentário
sobre o uso permitido e até aconselhável dos adjetivos, no devido
contexto; igualmente colocarei em separado, com o destaque merecido,
assim como farei no que se refere à contribuição de Ana Falcão, que me
privilegiou com a sua colaboração especializada.
Aliás, vou remeter a ela o seu comentário, considerando que estamos de
acordo em não aceitar a tal "expulsão" ou o "exílio" dos adjetivos,
uma categoria gramatical respeitável.

Abraços cordiais da amiga
Theresa Catharina

 

Jornalismo com ética e solidariedade.