Theresa Catharina de Góes Campos

  Oderfla

Desaparece com ele, o nosso querido Oderfla, não só
parte de nossa história, que pelo menos a minha não
tem lá essa graça toda, mas principalmente um pouco
de um tempo memorável. Até porque ninguém é uma
ilha, muito menos uma geração inteira.

Desaparece, pede licença,
alguém que resgatava a música erudita, a grande
arte, naqueles instantes em que
precisávamos ouví-la.

Desaparece aquela figurinha pequena, irrequieta, mas cheia de
vida e ternura, sempre pronta a um sorriso rasgado, sempre disponível
a uma escuta até mesmo lacrimosa, piegas, principalmente nas
perdas afetivas. E como foram tantas.

Praticamente já o perdemos. Não adianta chorar. Em verdade
morrer é a solução de tudo, numa vida, em qualquer vida,
onde nunca se está com essa bola toda.

Nós o estamos perdendo, e ele a nós todos. Mas, se fosse
possível uma contabilidade barata, fajuta, poderíamos
dizer que quem mais perde somos nós.

Isto porque jamais teremos
quem tanto nos tolerou, quem tanto nos absolveu, quem
tanto nos alegrou, quem tanto nos amou.

Guardo dele a melhor memória que se pode ter de um ser
humano, principalmente naqueles momentos de sufoco, onde
a madrugada escura parece não ter fim, onde de verdade se conhece
os amigos.

Oderfla deixou-me esse testemunho;
apesar dos pesares, mesmo assim vale a pena
viver a vida.

Ele, já há algum tempo se afastara, quem sabe por discreta
e profunda sabedoria. De todos nós. Ele que sempre oferecia
um ouvido amigo, ultimamente, parece, mergulhara, no
insondável do mundo, no éter, para recorrer ao seu próprio
discurso. Medida sábia, e prudente.

E, no entanto, agora, parece que ele se encaminha para o Adeus.

Não rogo que vá em paz. Ele não precisa dessa força. Dessa
bobagem. Ele sempre viveu em seu inferno particular, e muito
bem, mas em paz com todos os que
tiveram o privilégio de tê-lo como amigo.

Edilson Martins
 

Jornalismo com ética e solidariedade.