XÔ, 
														NOSTALGIA SUSPIROSA!
														
														
														
														 
														
														
														Tereza 
														Halliday – Artesã de 
														Textos
														
														 
														
														
														Li na 
														Internert crônica de 
														José Antonio Oliveira de 
														Rezende sobre visitas de 
														antigamente, que 
														apareciam sem avisar.  
														Ele não informa que 
														telefone fixo (o único 
														então existente) era 
														raro nas residências e 
														as distâncias eram 
														curtas, principalmente 
														nas cidadezinhas.  Mas 
														descreve, embevecido, a 
														calorosa acolhida do 
														compadre e da comadre de 
														seus pais aos visitantes 
														de supetão. Em certo 
														momento, chamavam para 
														tomar um café e, num 
														passe de mágica, 
														aparecia sobre a mesa 
														lauto lanche de iguarias 
														feitas em casa, ali 
														prontinhas, como se 
														estivessem à espera dos 
														comensais. 
														
														  
														
														
														  Eu sei 
														qual era a mágica: na 
														casa do compadre e da 
														comadre havia, no 
														mínimo, duas empregadas 
														em tempo integral, 
														dormindo no serviço, com 
														jornada de trabalho das 
														6 às 21 horas. E a 
														comadre dedicava-se 
														inteiramente à casa - 
														não labutava no mercado 
														de trabalho para 
														afirmar-se 
														profissionalmente e 
														aumentar a renda 
														familiar a fim de 
														custear a realização dos 
														sonhos de consumo dos 
														filhos. Eram poucos os 
														anseios de ter. E 
														tornavam-se exercícios 
														de paciência e de 
														aprendizado sobre 
														limites financeiros: 
														desejei uma bicicleta 
														desde os oito anos de 
														idade e só vim a 
														recebê-la aos 11. 
														
														
														  
														
														
														 Rezende 
														suspira pelas antigas 
														visitas não anunciadas e 
														lamenta que só se queira 
														encontrar os amigos fora 
														de casa. Pois eu aprecio 
														marcar uma saída para 
														renovar contatos face a 
														face e espairecer. 
														Difícil é encontrar 
														restaurante sem TV 
														ligada nem som 
														anti-conversa. Quanto a 
														visitas de amigos, 
														prefiro ser avisada, a 
														fim de preparar o 
														coração, como a raposa 
														ensinou ao Pequeno 
														Príncipe: “É preciso 
														ritos. Se tu vens, p.ex. 
														às 4 da tarde, 
														desde as 3 começarei a 
														ser feliz”.  Quero 
														tempo para tirar das 
														mãos os odores de 
														tarefas – tinta, cebola, 
														rato de computador; 
														ficar cheirosa, fazer um 
														suco em honra do 
														visitante anunciado, 
														escolher o melhor bolo 
														na padaria do bairro, 
														sem vergonha de não ter 
														sido feito por mim.
														
														
														  
														
														
														  Sim, 
														houve dias mais amenos, 
														onde os grandes medos 
														eram de alma do outro 
														mundo. E os ladrões se 
														afastavam ao apito do 
														guarda noturno fazendo a 
														ronda na vizinhança. 
														Contudo, não sofro de 
														Nostalgia Suspirosa. 
														Guardo boas lembranças, 
														mas sou pessoa do meu 
														tempo – o de hoje, onde 
														me empenho em aguar as 
														plantinhas da amizade 
														com telefonemas, e-mails 
														individuais, almoços 
														fora de casa. 
														
														
														  
														
														
														O autor 
														lamenta: “O tempo 
														passou e me formei em 
														solidão”. Aponta a 
														TV, DVDs e e-mails como 
														professores de solidão:
														“Cada um na sua e 
														ninguém na de 
														ninguém”.   Omite 
														que, no tempo das 
														visitas não anunciadas, 
														já havia solidão e 
														isolamento. Sempre 
														houve. Mas criança não 
														era para saber dessas 
														coisas. Para ele, as 
														casas de hoje, sem 
														visitas, “vão se 
														transformando em 
														túmulos... que escondem 
														mortos anônimos e 
														possibilidades 
														enterradas”. A minha 
														é templo vivo, 
														restaurador das energias 
														exauridas na cidade 
														insegura, suja, 
														barulhenta. E estou 
														entre os afortunados que 
														alternam convívio e 
														solidão contente. Longe 
														da dolorosa “formatura” 
														que Rezende constata em 
														seu currículo de vivente 
														do século XXI.
 
														
														(Diário 
														de Pernambuco, 
														29/03/2010, p.A-13)
														
														
														De: Tereza Lúcia 
														Halliday
														Data: 30 de março de 
														2010 07:41
														Assunto: Re: XÔ, 
														NOSTALGIA SUSPIROSA!
														Para: Theresa Catharina 
														de Goes Campos
														
														Gratíssima pelo 
														incentivo e divulgação 
														do meu texto.
														Curioso é que recebi a 
														crônica que o inspirou, 
														de três amigos homens - 
														saudosos desse passado e 
														sem ter noção do lado 
														prático das casas de 
														antigamente, que fiz 
														questão de lembrar-lhes: 
														presenças femininas - 
														mãe, empregadas - 
														fazendo as "mágicas" da 
														comida e roupas 
														prontinhas para usar.
														
														Abração, Tereza.