Theresa Catharina de Góes Campos

 
A MESTRA DE CABELOS AZUIS
 
Tereza Halliday – Artesã de Textos
 
Rosto corado, cheio de energia e bom humor, Maria Estephânia (com ph) Nogueira chamava a atenção por seus cabelos pintados de azul. Nada vulgar, era uma tonalidade linda.  Chamava muito mais a atenção pela qualidade das suas aulas de inglês, em curso particular e na antiga Sociedade Cultural Brasil-Estados Unidos – SCBEU. Anos mais tarde, a rara tintura azul sumiu do mercado e a mestra resignou-se aos igualmente belos cabelos grisalhos “salt and pepper” – cor da mistura de sal com pimenta do reino.
 
  Fui sua aluna no terceiro ano do curso regular da SCBEU. Na classe, Estephânia criou um grêmio literário chamado Lincoln Cultural Club, em homenagem ao presidente americano, autor de peça antológica da língua inglesa: o belo e enxuto Discurso de Gettysburg, que ela nos fez ler em voz alta, com expressiva entonação.  Na última aula de cada mês, reunia-se o grêmio, onde alunos recitavam poemas de cor. Previamente, Estephânia corrigia nossos erros de pronúncia. As reuniões tinham ata, que ela nos ensinou a redigir em inglês  - “the minutes”. Graças a suas exigências e entusiasmo, enriqueci meu vocabulário, conheci vários poemas e me encantei com Elizabeth Barret-Browning, Emily Dickinson, Henry W. Longfellow, Edgard Allan Poe, Robert Frost, entre outros.
 
Guardo, carinhosamente autografados, seus livros Canto Primeiro (1977) e Meu Caminho é outro” (1982). Assim como carta em inglês, anunciando seus planos de aposentadoria das funções de docente “a fim de dedicar mais tempo à literatura e ao estudo”. Era ensaísta apurada. Em 1994, foi eleita para a Academia Pernambucana de Letras.  De sua produção poética ressalto estes versos:
 
Solta as amarras e parte/ que não te leve o mar/  altivo barco / senão às fontes vivas da verdade. (...) Rompe as amarras e parte / retorna, sol poente, fecundado / liberto barco / o sêmen da verdade enfim plantado”.  “De palavras simples / tece o teu verso / e no pequeno / das coisas / vê o universo”. “No pergaminho da face / a marca do tempo./ Na cabeça erguida / a marca da vontade”. De suas palavras em prosa, esta assertiva: “O que me anima e me preocupa é, mais que qualquer outra coisa, o eterno. O eterno no agora”.  Neste junho de 2011, a mestra de cabelos azuis adentrou uma outra dimensão do eterno.
 
Professor de mão cheia, a gente nunca esquece. Nem a gratidão prescreve.
(Diário de Pernambuco, 20/06t/2011, p.A-11)
 

Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.
Artesã de Textos
 

Jornalismo com ética e solidariedade.