Theresa Catharina de Góes Campos

  DE QUANTO TEMPO UM TRADUTOR PRECISA PARA REDIGIR UMA LAUDA?

Esta é uma pergunta muito rotineira, lamentavelmente enfrentada por todos os tradutores; digo lamentavelmente porque é preciso ser tradutor para respondê-la... Mas, sendo um tradutor, jamais faria tal pergunta... Se numa hipótese, ousasse fazê-la, já saberia de antemão que estaria a indagar algo objetivo quando, na verdade, as possíveis respostas envolveriam subjetividade, contextos intelectuais e materiais diversificados, condições físicas para a realização dos trabalhos e, sobretudo, diferentes graus de experiência com o idioma, a cultura, e até experiência de vida, sem falarmos em atitudes relativas aos diversos níveis de qualidade de uma tradução.

Aqui não estamos nos referindo, com certeza, a documentos padronizados, como certidões de nascimento, batismo, casamento, e outros textos para os quais já existem formulários e ocorre apenas o preenchimento/a troca de nomes, datas, endereços. Acreditamos, inclusive, que haveria dificuldade em responder à questão de quanto tempo se leva a realizar um trabalho em praticamente todas as áreas acadêmicas e profissionais. O professor, por exemplo, pode levar mais horas-aula a ensinar determinada matéria para uma turma de estudantes e menos tempo para outro grupo; o cirurgião médico ou dentista, ao mencionar sobre a duração de um procedimento, entende, e quer que nós entendamos também, que tudo vai depender do paciente, de todos os membros da equipe, de seus equipamentos, da eficiência dos medicamentos e dos recursos utilizados, sem falarmos de todos os cuidados pré-operatórios. Do mesmo modo, o engenheiro encontrará dificuldades ou facilidades variáveis em cada estrada, montanha e queda d’água, em seus projetos de pontes, estradas e represas. E quanto aos oradores e palestrantes, bem sabemos que há discursos logo esquecidos porque nada dizem e frases bem construídas, bem planejadas, que há séculos são admiradas e sempre repedidas porque mantêm a sua eficiência, sabedoria e seu poder de comunicação.

Neste nosso século XX, por exemplo, dominado por tecnologias que permitem a onipresença da propaganda, qualquer publicitário sabe que um slogan talvez demore a ser elaborado, testado, aprovado pela equipe antes de ser submetido ao gosto do público. Uma expressão, uma frase de efeito não pode, na agência de publicidade, ser remunerada ou avaliada pelo tempo que se leva a datilografá-la ou digitá-la! Nenhum profissional diria isso... ou não seria um profissional. Recentemente, por exemplo, a Coca-Cola investiu bastante em material publicitário onde, além de seu produto, uma única palavra aparecia: SEMPRE. Quanto tempo se leva para escrever, nesta época das comunicações instantâneas, uma “palavrinha” tão simples?! Não somente os filósofos e lingüistas responderiam sorrindo, numa atitude complacente, que uma palavra tem história, etimologia, significados e contextos, além de graus de eficiência mutáveis de acordo com os interlocutores e objetivos a serem alcançados; enfim, que os vocábulos têm passado e famílias, antepassados e descendentes; que expressões ganham ou perdem atualidade, algumas levam a frustrações, outras são enganadoras... e algumas, parecem indicar um futuro vitorioso, ao se considerar o seu potencial...

Após tais considerações, tentaremos explicar o tempo necessário para se chegar a uma lauda de tradução. Mas precisamos começar informando que o tradutor juramentado recebe o apoio da lei para considerar cada página de documentos, como certidões de nascimento, casamento, etc. como duas (2) laudas para efeito de pagamento, sendo que o valor da lauda também é publicado no Diário Oficial da União. Por aí se percebe que até a legislação pertinente já considerou variável a definição material do que seria uma lauda...
E se o governo assim fala, o que diremos nós, pobres mortais? NOSSA RESPOSTA PROFISSIONAL, E A ÚNICA ETICAMENTE POSSÍVEL, SÓ PODE SER UMA: o tempo que o tradutor leva para redigir uma lauda pode variar bastante, de meia hora a um mês. Por quê? A variação depende de inúmeros fatores:

a) se o texto é rotineiro ou raro;
b) se o vocabulário é técnico-científico ou não;
c) se as fontes de consulta imediata estão disponíveis;
d) se há necessidade de pesquisa complementar, inclusive para
verificar se há antecedentes de textos similares;
e) se há necessidade de consulta a outros profissionais para a
determinação de terminologia própria, específica;
f) se há condições adequadas (físicas, materiais, intelectuais,
emocionais) para o tradutor realizar o trabalho solicitado;
g) se o tradutor tem conhecimento e experiência específicos na(s)
área(s) do texto;
h) se, desde a primeira lauda, e principalmente antes da tradução
dessa primeira lauda, torna-se necessária a leitura prévia, de todas
as outras laudas do mesmo texto ou documento, ou similares, para que o
tradutor compreenda melhor do que ali se trata, e talvez assim
identifique a demanda para uma pesquisa prévia de termos e expressões
adequados.

Ao receber qualquer texto para tradução, o profissional precisará proceder à leitura rápida do mesmo, antes de fazer qualquer previsão do prazo para a realização do trabalho. Antes disso, seria adivinhação, previsão sem objetividade, e, portanto, sem profissionalismo.

Theresa Catharina de Góes Campos
Brasília-DF, maio de 1994.
 

Jornalismo com ética e solidariedade.