Theresa Catharina de Góes Campos

 
PAPO DE SUPERMERCADO
 
Tereza Halliday – Artesã de Textos
 
Dei o carinhoso apelido “Matraca” ao verborrágico anunciador que tenta atrair clientes para compras específicas dentro do supermercado. Funcionárias dos caixas dizem que aprenderam a “desligar”, senão ficariam piradas com aquela falação ao pé do ouvido durante todo o expediente de trabalho. Respeito a Matraca enquanto trabalhador que ganha a vida honestamente e funcionário simpático a cumprir suas obrigações. Mas sua tarefa é incômoda a quem prefere fazer compras sossegadamente, sem assédio verbal.
 
Desafiei um funcionário graduado a mostrar-me resultado de pesquisa comprovando aumento de vendas em consequência do bla bla bla pelo microfone. A resposta foi um sorriso amarelo. Tenho saudade do tempo em que percorríamos em paz corredores de mercadorias, ao som de suave música porque, segundo os doutores do marketing da época, tal música amolecia nosso coração, induzindo-nos a comprar mais. Hoje, é o microfoneiro quem enche o espaço com seu ramerrão de discurso publicitário, dando urgência ao ato de comprar e tecendo loas à política da casa: “Não é promoção nem oferta, é preço baixo todo dia, todo dia, todo dia”. Eita argumentozinho falacioso!
 
Não posso atender aos apelos do supermercado em prol da limpeza do meio ambiente, recomendando usar caixas de papelão em vez de sacos plásticos, enquanto a própria empresa pratica a poluição sonora e verbal no recinto de sua loja. Às vezes, a voz da emissora de rádio interna e a voz da Matraca se sobrepõem, competindo por nossa atenção. Ainda bem que baixaram um pouco o volume do som. Mais uma vez, perguntei a uma funcionária graduada: isso aumenta realmente as vendas? Resposta de sorriso branco: “O pior é que aumenta mesmo. Os vendedores do setor [do produto matraqueado] dizem que os clientes ouvem e saem correndo para comprar”.
 
Arquivo meu caso. Recolho-me à minha insignificância. Na hierarquia de cliente minoritária que se sente azucrinada por assédio publicitário dentro da loja, tenho patente abaixo do cachorro do comandante - para usar uma comparação do anedotário militar. Fazer o quê? Aprender a “desligar”, como as sábias funcionárias dos caixas. E dedicar-me inteiramente à obrigação de consumidora ressabiada: verificar maçã por maçã a fim de evitar levar fruta estragada, evitar as baratinhas que passeiam por cima das frutas e hortaliças, checar se há ovo quebrado dentro da embalagem, rejeitar os congelados que degelaram e foram recongelados, ficando com aquela aparência suspeita. Deus te abençoe, Matraca. Deves ser um anjo no meu caminho, para ensinar-me paciência e indiferença. (Diario de Pernambuco, 5/12/2011, p.A-11).
 

Tereza Lúcia Halliday, Ph.D.

Artesã de Textos
 

Jornalismo com ética e solidariedade.