Theresa Catharina de Góes Campos

  JORNALISMO - UMA QUASE ROTINA DE EXPERIÊNCIAS

Ao recordar algumas de minhas experiências como jornalista, pretendo fazer, desta conversa informal com estudantes e colegas iniciantes na profissão, uma oportunidade para trocarmos idéias e análises de situações quase rotineiras, mas que, de qualquer modo, valem a pena ser objeto de uma reflexão crítica.

CAUTELA POLÍTICO-PARTIDÁRIA
Na década de sessenta, assinei diversos artigos políticos, publicados em jornais nordestinos e no Distrito Federal. Foram matérias informativas, mas escritas com o coração, ditadas por sinceridade e emoção: em pouco tempo descobri que a melhor atitude teria sido deixar aqueles textos para os que estavam atuando como assessores das personalidades envolvidas, motivo pelo qual estariam cumprindo a sua obrigação, fazendo conhecidos os projetos e as plataformas apresentadas aos eleitores. Quanto a mim, jornalista trabalhando com a produção e redação de programas televisivos e radiofônicos de caráter cultural (Rádio Alvorada, Rádio Planalto, TV Nacional, TV-Rádio Clube de Pernambuco, Rádio Tamandaré), teria sido uma decisão melhor esperar o tempo passar, enfim aguardar a evolução dos fatos ou a realização das promessas, ou fazer uma pesquisa pessoal de maior profundidade, desenvoldida durante um período de tempo mais extenso, com a finalidade de investigar e analisar em três dimensões: a informação no passado, presente e futuro; indivíduos, contextos, hipóteses de conseqüências, alternativas, efeitos possíveis. Alguém poderia chamar isso de rigor desnecessário para os não-historiadores... Contudo, haveria o benefício de se revisar a situação, um tanto sem pressa para a interpretação dos fatos mais próxima da verdade.

ASSOCIAÇÕES E CENTROS ACADÊMICOS
As recordações incluem atividades nas lideranças estudantis, participando da edição de jornais, boletins, elaboração de folhetos e cartazes, redação de telegramas, com o objetivo de obter maior participação dos alunos nas associações e diretórios (secundários e universitários). Também nessas contribuições, comecei a compreender que nem sempre a pressa – para atender às supostas urgências – produzia resultados e atitudes confortáveis para os responsáveis por palavras e frases de efeito, verificando que as declarações precipitadas se tornavam, depois, bem difíceis de serem defendidas por um período mais longo. As reuniões e os debates, antes da divulgação de opiniões, mostravam-se cada vez mais essenciais, principalmente quando as equipes aceitavam se deter um pouco mais no estudo dos interesses locais, regionais e nacionais.

Por vezes, foi necessário, ainda, pensar em termos internacionais. Ainda bem que os erros, quando visíveis, podiam ser desculpados com expressões como “idealismo dos jovens”, “falta de experiência”, “arroubos da juventude”. Mesmo assim, os deslizes (individuais ou do grupo) me causavam aquele conhecido aperto de coração, um remorso por saber que não teria mais como revisá-los, para não citar uma sensação humilhante no intelecto.

SUCESSO TOTAL OU ANÁLISE FALHA?
Em outras circunstâncias, parece que tudo saiu melhor do que esperávamos, como ao recordar, com alegria e satisfação profissional, o trabalho desenvolvido com a equipe do Centro de Comunicação Social do Nordeste – CECOSNE – uma obra elogiada por organizações de apoio às comunicações não-comerciais, sediadas na Europa e na América do Norte. Relembramos, entre colegas de jornalismo, também envolvidos com o CECOSNE, as ações de divulgação e a execução de cursos para o treinamento visando à produção de programas de rádio, TV e a realização de filmes, assim como no planejamento de eventos criativos, para despertar a atenção de leigos e profissionais, num esforço para atrair o apoio da comunidade e o interesse dos patrocinadores.

E se não achamos defeito em tantas campanhas avaliadas como vitoriosas, isso não é garantia de paz com a consciência: talvez tenha ocorrido alguma negligência não-detectada; ou alguém se calou, por omissão, malícia ou caridade, nos artigos que assinou; ou falhamos na interpretação de alguns acontecimentos. Contudo, o gosto do sucesso faz bem a todos nós, pobres mortais, eternamente em busca da imortalidade pelo mérito de nossas ações, sempre originalíssimas... Para não cairmos em tal acomodação, aconselha-se o que nunca é demais: refletir nas palavras, e, principalmente, no conteúdo da matéria, procurando, mesmo na rotina das atividades, um contínuo aperfeiçoamento profissional.

COMUNIDADE ACADÊMICA

Debruçadas sobre exaustivos estudos, pesquisando com olhos mais para o futuro do que para o imediatismo do presente (na maioria dos casos), as universidades oferecem uma oportunidade especial para os assessores de comunicação. Minhas recordações indicam a importância de se exercer uma permanente "sociabilidade cultural" no exercício do jornalismo, com ênfase nas publicações da editora universitária, na edição dos informativos, nas promoções do departamento de assuntos culturais e nas produções radiofônicas, televisivas e cinematográficas. A preocupação com a qualidade acadêmica deve incluir, ao mesmo tempo, um esforço para tornar informações e análises mais acessíveis, em termos interdisciplinares, com o objetivo de congregar comunidades diferentes, como, por exemplo, nas campanhas direcionadas a públicos externos, inclusive de níveis culturais diversos.

CINECLUBE DOS EDUCADORES

Para os que vêm acompanhando as minhas atividades como fundadora responsável pelo CINECLUBE DOS EDUCADORES, é fácil compreender que se trata de uma proposta de formação de um público atento aos aspectos visuais e ao conteúdo das obras cinematográficas e de outras manifestações artísticas e culturais.

A finalidade é apoiar, prestigiar e recomendar bons filmes (nos cinemas, nas locadoras de vídeo, na TV e em cineclubes diversos); os sócios não pagam taxas ou mensalidades; prestigiam eventos locais e nacionais; e, principalmente, fazem intercâmbio de informações e opiniões. Em sua maioria, os associados são educadores: pais, professores, orientadores, psicólogos, psiquiatras, jornalistas, escritores e outros profissionais que, conscientes da importância do cinema, participam e/ou recomendam filmes e debates sobre essas obras (na família, na escola, nas diferentes comunidades).

Para cada membro, existe a opção de atuar espontaneamente, de acordo com as suas tendências pessoais e segundo as suas possibilidades; o material de leitura, estudo ou divulgação, pode ser distribuído aos interessados, com frequência, durante a realização de mostras (as chamadas de "alternativas" ou as comerciais); os contatos são informais (telefônicos/pessoais/via fax/internet), como a promoção de reuniões e a elaboração de sugestões. O diálogo tem um papel muito especial nesse esquema de admiração pelo cinema e as artes em geral, nas suas manifestações culturais através dos tempos, com a sua estética e sua evolução, em suas formas de expressão artística.

O TOQUE MÁGICO DO OLHAR

Neste século do olhar, a imagem nos toca de várias maneiras; os sentimentos criam uma face externa; os “travellings” podem nos arrancar de uma posição estática; as cenas congeladas talvez tenham o dom de uma varinha mágica, transformando algo em nossa vida, no âmbito pessoal ou profissional. Talvez as superposições consigam nos fazer visualizar as nuanças de um personagem, ou nos incentivem um olhar mais profundo, nos closes inesquecíveis...

As épocas distantes se aproximam, voltam a ocupar nosso pensamento, e uma revisão histórica ocorre, como conseqüência de um diálogo acentuado pela trilha sonora, uma paisagem indescritivelmente linda, uma expressão facial pungente. Eis que não somos mais indiferentes àqueles conflitos geograficamente distanciados, porque contemplamos, com grande emoção, suas dores universais. Talvez porque nos determinemos a rejeitar qualquer explicação ou desculpa para as guerras, um posicionamento moral consciente, porque um filme nos fez vivenciar, no coração, as sucessões de tragédias causadas por conflitos entre nações, povos e regiões.

Apesar de tudo, também somos convidados a rir com situações imaginárias ou de nosso dia a dia. Que as risadas também sejam inteligentes, revelando uma percepção maior, uma compreensão das situações reproduzidas na tela ou criadas pelo roteiro.

Com direção e interpretação de qualidade, mesmo os não-românticos chegam a vibrar com o lirismo de algumas obras cinematográficas, descobrindo sentimentos em si mesmos que se esforçavam para manter escondidos.

Para surpresa de muitos, a proposta do CINECLUBE DOS EDUCADORES ousa se definir como educação dinâmica da sensibilidade: ver, sentir, refletir criticamente, perceber, agir!

Theresa Catharina de Góes Campos
Cineclube dos Educadores
Brasília-DF, 1988
 

Jornalismo com ética e solidariedade.