Theresa Catharina de Góes Campos

 
CIDADANIA DERRAPA NAS RUAS
 
Tereza Halliday – Artesã de Textos
 
Amigo motociclista reporta situações perigosíssimas enfrentadas por ele nas ruas desta cidade.  Não é devido aos automóveis e ônibus, mas sim, por falta de infraestrutura para acolher veículos motorizados de duas rodas.  E os não motorizados também. Impávidos ciclistas! As ciclovias ainda são de faz de conta, mas, felizmente, os gestores do espaço público estão correndo atrás do prejuízo de não havê-las tornado prioritárias, tempos atrás.  Pressão neles!
 
 Motoqueiro e ciclista, meu amigo é prudentíssimo, por seu rigor com o aspecto “segurança”, devido à sua formação de piloto profissional de avião. Portanto, não sai por aí fazendo besteira. Mas se arrisca além da conta, simplesmente por estar montado numa moto em ruas e avenidas impróprias para motociclistas. Enfrenta, a cada metro, desníveis de calçamento, bocas de lobo abertas, restos inacabados de obras, buracos de todos os tamanhos – verdadeiros alçapões e arapucas para derrubá-lo. Inconformado, ele pergunta: “Por que o governo não cuida de dar vias seguras para motoqueiros, que são mais vulneráveis e usam um veículo muito menos poluente e de mais fluidez no tráfego?”. Sim, reconhece as loucuras de certos motoqueiros. Mas define o descaso com o chão das ruas como grande desrespeito a todos os cidadãos motociclistas que usam esse veículo para trabalhar, seja ganhando a vida como entregadores – motoboys e motogirls - seja  para se deslocar até o local de trabalho. 
 
Infelizmente, esse desrespeito brabo se estende aos pedestres também, que usam o veículo menos poluente do mundo: as próprias pernas.  Muitos deixariam carros e motos em casa se pudessem caminhar para o trabalho ou escola, com segurança e fluidez. Caminhante contumaz, fui vítima de fratura por queda em calçada destrambelhada e de alto risco, tal qual as ruas enfrentadas pelos motoqueiros. E olhem que já conheço os buracos e monturos de cor, nos meus trajetos como pedestre. O que me vitimou foi um buraco novo, desconhecido.
 
Meu amigo motociclista e eu tivemos o privilégio de ser educados para ser bons cidadãos. Daí a tendência a sermos “reclamões” e indignados. Mas, muitos governantes não foram educados para ser bons cidadãos e assim, são incapazes de priorizar, em decisões políticas e administrativas, o respeito que jamais aprenderam. A qualidade das nossas calçadas e ruas é um ótimo indicador da péssima qualidade da nossa cidadania. Quem puder emigrar para um país onde haja pouca coisa a reclamar, escapará da incúria com o espaço público brasileiro. Quem for residente desta cidade e deste país, por escolha ou falta de opção, seja zen, olhe o lado positivo de estar aqui e vá levando. Como dizia minha sogra, “quem pode, pode, quem não pode se sacode”.  Por isto, danço frevo, xaxado e baião.
(Diário de Pernambuco, 3/6/2013)

"Se avexe não. Amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada" (Accioly Neto)

(Avexar - forma nordestina de vexar, significando apressar-se, afligir-se)

 

Jornalismo com ética e solidariedade.