Theresa Catharina de Góes Campos

  De: Tereza Lúcia Halliday
Data: 11 de agosto de 2013 22:35
Para: Theresa Catharina de Goes Campos

TEM DE SER DO SEU JEITO?
Tereza Halliday – Artesã de Textos

Existem muitos jeitos de fazer as coisas: o seu, o meu, o do prefeito, governador, ou presidente da república que estiver de plantão; o do chefe, síndica, empresário, operária, funcionário subalterno, colega de trabalho... Todos sabem certas coisas melhor do que eu, cada qual com sua experiência e história de vida. Visando melhorar nossa calçada, bairro, condomínio, cidade ou país, por que o meu jeito ou o seu jeito, leitor, teria de prevalecer? Por pelo menos três motivos: (1) você e eu somos bem intencionados, cremos profundamente que estamos certos e que o nosso jeito tornaria o mundo melhor. (2) Dói que certos jeitos diferentes do nosso sejam tão irracionais, ou eticamente inaceitáveis. (3) Por genética humana, queremos ser reconhecidos pela boa qualidade das nossas ideias.

Felizmente, com o tempo vivido, meu baixo índice de sabedoria está subindo um pouquinho. Já consigo aceitar numa boa que as coisas não têm de ser do meu jeito. Ainda que a opinião ou sugestão apresentada por mim contenha bom senso e outros elementos de sustentação, meu ego não é afetado por recusa em acatá-la. Mesmo que contribuísse para evitar absurdos ou tornar algo melhor, minha visão de certo assunto ou situação não tem de ser adotada para que eu seja feliz. Como dizia uma mestra em relacionamentos humanos: na família, escritório, clube, condomínio, associação, não fazer das coisas um cavalo de batalha, não dar coice, nem permanecer no mesmo trote do “quero assim, quero assim, quero assim, pó toc pó toc pó toc” – som de mulinha bronca, não de hominídeo evoluído.

Para mim, já é um milagre poder exercer o direito de dizer o que penso sem ser acusada de subversiva, nem ir presa porque meu jeito de pensar e ver as coisas desagradou. Já é bom demais que minhas opiniões e sugestões não me levem a ser punida por autoridades civis, militares ou eclesiásticas, mesmo que não concordem com o meu ponto de vista e tenham dificuldade em conviver com jeitos diferentes dos deles. Melhor ainda seria se alguns interlocutores deixassem de considerar questionamentos, alertas e sugestões como ataques, agressão, mania de polemizar. Os que ficam agastados ou se descontrolam quando as coisas não saem do jeito deles, estão com o índice de sabedoria ainda mais baixo do que o meu.

Um aforismo zen que muito me impressionou, afirma: “Você não está aqui para mudar o mundo. O mundo está aqui para mudar você”. Então, vou aprendendo a viver com o mundo arrumado do jeito dos outros, ou desarrumado segundo a conveniência deles. Encontrei uma exceção terapêutica: minha nova máquina de lavar roupa, toda modernosa, tem oito programas, entre os quais “roupa pesada”, “tecidos delicados”, “lavagem rápida” e “meu jeito”. É só apertar o botão “meu jeito” e acreditar que fui eu mesma quem decidiu aquela forma de lavar a roupa. Grande jogada de marketing do fabricante. Faz de conta que me entende e, de quebra, dá-me um gosto. Enquanto isto, apuro a consciência de que, fora do programa da máquina de lavar, as coisas não têm mesmo de ser... do meu jeito. (Diário de Pernambuco, 12/8/2013).

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"Se avexe não, amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada.
(Accioly Neto)
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Avexar-se - forma popular nordestina de vexar-se: apressar-se. afligir-se.

 

 

Jornalismo com ética e solidariedade.