Theresa Catharina de Góes Campos

   

CAMINHOS DA FEMEAZINHA

Tereza Halliday – Artesã de Textos


O bebê fêmea já sai da maternidade usando brincos. Mesmo estes tendo se tornado adornos adultos unissex, ainda são indicadores do sexo feminino entre bebês. Eu mesma procuro guiar-me por este detalhe, quando encontro um bebê, a fim de acertar no elogio “fofinho” ou “fofinha”. Pouco depois, a fofinha recebe fita no cabelo - tipo diadema, para diferenciá-la dos bebês machos. Até aí tudo bem. Que seria das mamães recém-empossadas no cargo se não pudessem brincar de boneca um pouco? Talvez o embonecamento do bebê de carne e osso ajude a aliviar a baita responsabilidade do papel de mãe, que todo mundo festeja, minimizando as canseiras, preocupações, plantão permanente que estão por vir.

Lá pelos dois aninhos, começa a capacitação para seduzir. Mães bem intencionadas, mas sem noção, vão nas águas do marketing de moda infantil e aceitam que a filha pequerrucha use sandálias de salto - pelas quais os ortopedistas terão muitos lucros em seus consultórios; batom, unhas pintadas, blush, bolsinhas de grife ou não; biquínis onde ainda não há seios para encobrir minimamente. É bom cultivar a autoestima da garota, incentivar pequenas vaidades que incrementarão sua aparência feminina. Mas, não travesti-la de mulher quando ainda é apenas criança. Aliás, ela é mais que isto. É pessoa - isto mesmo, pessoa, mais que fêmea. Precisa desenvolver, primeiro, outros talentos e esperar o amadurecimento natural. Por sua vez, o menino vai absorvendo, desde pirralho, o valor segundo o qual é motivo de orgulho ser “galinha” – termo hoje aplicado tanto à mulher quanto ao homem afeito(a) uma vida sexual intensa e variada. (Ver Dicionário Houaiss). Seduzir e ser seduzida(o) torna-se troféu de masculinidade e feminilidade.

Estão roubando a infância dos machinhos e das femeazinhas. Estas, precocemente emperiquitadas para parecer mulheres adultas sedutoras. Pediatras e psicólogos têm alertado para a insalubridade do excesso de estímulos sexuais captados por mentes infantis, passando a atuar num corpo que ainda não completou o crescimento. Mais cedo do que os pais desejariam, a ex-menina estará apta, sim, a atrair um macho, jovem, fogoso, com superprodução de hormônios e estimulado pela gatinha que mães e tias fantasiaram de gatona desde quando era apenas um filhote. Não precisa empurrá-la, a Natureza tem seu próprio cronograma e a criança fêmea se transformará em moça, ansiosa para “ficar”. E da ficância, puff! Nasce um pimpolho ou pimpolha, de pais adolescentes ou jovens adultos sem eira nem beira. Grande transtorno para eles, genitores não habilitados, que têm apenas a capacidade biológica de procriar. Transtorno para os avós que adquiriram, de supetão, o novo status, com nova carga de preocupações, despesas, trabalheira, sacrifícios. Certo, a babação geral se seguirá, com montes de fotos no Facebook , Instagram e o amor de que o bebê tanto precisa. Mas, não apaga o fato, sabiamente reconhecido por uma jovenzinha grávida de “ficância”: “Fomos irresponsáveis”. Toda uma cultura tem parte nessa irresponsabilidade.

(Diário de Pernambuco, 24/2/2014)
 

 

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