Theresa Catharina de Góes Campos

     
O PRODUTO CINEMATOGRÁFICO

Guido Bilharinho

Em cinema, mais do que em qualquer outra manifestação artística, confunde-se comumente técnica, profissionalismo e habilidade com arte.

A realização fílmica pressupõe determinada infra-estrutura, conquanto muito inferior ao que se alardeia, mas, sempre, de qualquer modo, necessária, por mínima que seja.

Por sua vez, toda infra-estrutura exige recursos financeiros, os quais, reunidos, deflagram processo técnico-industrial.

Quanto maiores e mais bem administrados esses recursos, mais amplo o poder de contratação dos melhores técnicos e profissionais do ramo, como acontece nos demais empreendimentos industriais.

Requer-se, também, no caso, como em qualquer caso semelhante, sucessão e acúmulo de experiências individuais e coletivas que, com o tempo, compõem, e, em muitas circunstâncias, cristalizam-se numa tradição.

O cinema estadunidense reúne esses elementos em alto grau de desenvolvimento, não sendo, pois, nenhuma surpresa ou fenômeno o estágio (ou estádio, como preferem os puristas) atingido por sua indústria cinematográfica.

Alude-se propositadamente à indústria e não a cinema, já que, com as exceções de praxe - uma delas ocorrente em vários, não em todos, os filmes do cinema independente dos Estados Unidos - não se realiza mais cinema, porém, produzem-se filmes, que saem dos estúdios como qualquer outro artefato procedente das fábricas, a exemplo de sabonete, sapato, pasta dental, etc.

Evidente que, à semelhança dos demais produtos, sua “qualidade” é extremamente variada e variável, não se podendo esquecer que a referida “qualidade” configura-se a partir do objetivo proposto. Como, na hipótese, a finalidade é agradar o público para faturar, esses, pois, seus parâmetros e medidas.

Realizam-se, então, filmes embasados por alta proficiência técnica e elevado grau de profissionalismo.

Em consequência, nessa perspectiva, existem os filmes apropriados e os inapropriados e toda a gama intermediária entre tais padrões, incluindo-se também os que os extrapolam para mais ou para menos.

Como a maioria absoluta dos espectadores encara o cinema apenas como mero desfrute diversional, seu critério de julgamento pauta-se também por essa concepção. Apropriados, pois, seriam os filmes técnica e profissionalmente bem feitos e conduzidos, com estória atraente, recheada dos ingredientes destinados a alegrar, seduzir e emocionar.

Além dessa categoria de espectadores, boa parte do jornalismo cinematográfico − não confundi-lo com a crítica − ao procurar atender a essas preferência e expectativa, incessantemente alardeia esse tipo de produto (industrial) cinematográfico, propositadamente ressaltando e valorizando os aspectos e elementos que o caracterizam como espetáculo e não como arte. O produto é o espetáculo, resultado do processo fílmico industrial. O espetáculo é o negócio.

Esse tipo de jornalismo cinematográfico insere-se nos desdobramentos da indústria do entretenimento e existe também em outras áreas, a exemplo, principalmente, da música. É confundido com crítica de cinema, quando, na realidade, não passa de marketing promocional.

Daí a razão de filmes absolutamente inexpressivos sob o ponto de vista artístico e cultural, mas, possuidores de virtualidades técnico-profissionais, que os tornam grandes espetáculos, ocuparem excessivos tempo e espaço nos meios eletrônicos de comunicação e nos cadernos de variedades dos jornais, alimentando, mantendo e procurando ampliar o mercado para tais produtos, que rendem, em suas às vezes gigantescas campanhas promocionais, grandes verbas publicitárias. Negócios, comércio, renda e lucro são, pois, os objetivos principais. De quebra, como poderoso e eficiente efeito colateral, a manutenção da inconsciência coletiva.

Poucas são ainda as pessoas que conseguem se livrar da imensa cortina de desinformação e enganos que os meios ditos de informação produzem na sociedade moderna, cada vez mais dominada, mesmerizada e condicionada por sua insidiosa, eficaz e permanente campanha deformadora e enganosa, a serviço da grande engrenagem industrial-comercial, na qual tais meios também se incluem.
(do livro inédito Ficção e Cinema)

(Obras-Primas do Cinema Brasileiro - toda
segunda-feira novo artigo em
https://www.facebook.com/guidobilharinho/)

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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão de 1980 a 2000 e autor de livros de Literatura (poesia, ficção e crítica literária), Cinema (história e crítica), História (do Brasil e regional).
 

Jornalismo com ética e solidariedade.