Theresa Catharina de Góes Campos

     
Recordando - Luíza Cavalcante Cardoso

Em sua última crônica na Revista do Correio deste domingo, 07 de abril, Paulo Pestana fala da força das lembranças do passado. E de como é difícil, muitas vezes, nos darmos conta das mudanças operadas no presente. Nossas lembranças permanecem então, meio desajustadas. Como as da sua pequena cidade, que vista do alto hoje em dia, não parece mais aquela antiga cidade. Não dando a “menor vontade de descer e ver de baixo. ” O bom das memórias, afirma, é que elas não mudam. É interessante! A minha cidade praticamente nada mudou. E, se houve mudanças, muitas foram para pior. Com a degradação de centros urbanos em escala insuportável! Assim, praças estão irreconhecíveis, certas partes do centro foram tomadas pelos camelôs. Inclusive impedindo trânsito de carros em plena via pública, no centro do comércio. O que nunca vi em nenhum lugar do mundo. Um pequeno rio continua, como sempre, a entregar dejetos e mau cheiro em uma das mais lindas praias da cidade. E os meus canais, entre as duas grandes lagoas Mundaú e Manguaba, um dos passeios mais lindos que se pode apreciar no Brasil, continua entregue à burrice e à incompetência dos gestores públicos. Favelas proliferam em cenários paradisíacos e o transporte entre as duas lagoas, que poderia ser feito de aerobarco pela profundidade dos canais, permanece sem ser explorado. Impedindo a criação de empregos no turismo e afastandoo alagoano e os turistas do contato com uma natureza belíssima! Cenário do qual hoje só usufruem os donos de grandes lanchas. Enfim, Maceió padece dos problemas de sua elite política. E embora sendo a terra mais festejada em música por seus filhos, talvez precisasse de outros tantos lutando por seu desenvolvimento urbano.

No entanto, os lugares onde vivi permanecem iguais: minha rua, meus colégios, a faculdade onde estudei. Eles não mudaram. Eu mudei. Meu coração passa indiferente por tudo aquilo. Não mais fazem parte das minhas lembranças ativas. Estão submersas no passado. Tantas coisas já foram vividas e em tantos lugares! Passei por tantas pequenascidades deste meu Nordeste, acompanhando o trabalho da Engenharia de Construção! Fui perdendo os vínculos. Criando outros. Ou aprendendo a viver sem me prender demais, pois eram muitas as transferências. Na verdade, com uma alma meio cigana, gostando do novo.

Porém, uma coisa sempre me prende. Sempre me renova. Está sempre igual e ao mesmo tempo única, com suas correntezas lambendo suas margens; seu pôr do sol feito de cinza e rosa; seu mangue das beiradas, com lama e caranguejo, no qual eu pisava horrorizada, mas mantendo a linha, que era para nunca esquecerem de me convidar nas múltiplas aventuras no sitio de meu pai. Aquela beira de lagoa, admirada da varanda da casa, ao cair da tarde, com as grandes barcaças de coco passando, com suas velas enormes, a cantoria dos barqueiros e a chamas do pequeno fogo na popa. Aquela lagoa onde eu remava desde pequena sozinha, observando tudo ao redor, com uma certa nostalgia que a gente não sabe de onde vem. Talvez a suspeita de que o tempo é curto e tudo é finito, frágil, as vezes indefinível. Só sei que depois de muito tempo, sempre ele, consegui enfim uma casinha perto da lagoa. E é de lá que renovo as forças, tranquilizo a ansiedade, bebo da beleza para fortalecer a alma. Às vezes, sinto que o tempo passa rápido demais. Ou poderia ter realizado antes este meu sonho.

Queria ter mais tempo. Além de uma ligeira desconfiança que o tempo não foi perdido. Não sei se o Paulo concordaria.

(07/4/2019) LUÍZA CAVALCANTE CARDOSO

De: Maria do Carmo Pereira Coelho
Date: sex, 12 de abr de 2019

Linda crônica.
Maria do Carmo

 

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