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								|  | De: "FENAJ" Data: Fri, 7 Oct 2005 17:04:12 -0300
 Para: theresa.files@gmail.com
 Assunto: Uma profissão contra a parede!
 
 
 Uma profissão contra a parede
 Narciso Lobo*
 
 Dois sinais bem intrigantes estão embutidos na 
								percepção do Jornalismo, pelo menos para alguns 
								segmentos importantes da sociedade brasileira: o 
								primeiro deles, em 2001, quando uma juíza 
								federal, em S. Paulo, acatou recurso suprimindo 
								a necessidade de formação superior para o 
								exercício da profissão, um preceito consagrado 
								entre nós; o segundo, mais recente, veio da 
								comissão mista de representantes do CNPq, da 
								Capes e Finep, que elaborou a Tabela de
 Áreas do Conhecimento, após um período de 
								consultas públicas, que ao propor a 
								reorganização dos campos dos diferentes saberes, 
								retirou o Jornalismo da condição de sub-área da 
								Comunicação, conforme historicamente vinha 
								acontecendo, com o total respaldo das 
								associações científicas interessadas, para 
								aloja-la, inocentemente, entre as cerca de 1400 
								simples especializações.
 Aparentemente uma coisa nada tem a ver com a 
								outra, embora se encaixem. Se a habilitação de 
								jornalista deixa de ser vista como profissão de 
								obrigatória formação superior, passando a função 
								a ser exercida por qualquer pessoa, com ou sem 
								curso universitário, faz todo o sentido que a 
								Tabela de Áreas do Conhecimento, dos três 
								órgãos, responsáveis, conjuntamente, pela 
								pesquisa, pela formação e pelo financiamento, 
								ensaiem considerar o Jornalismo como simples 
								especialização, no elenco de estudos como Mídia 
								e Conhecimento, Inteligência Artificial, e 
								outros, revestidos de características que não 
								configuram uma preocupação básica, estruturante, 
								como exige a formação profissional para o 
								exercício de função das mais importantes do 
								nosso tempo.
 Se do ponto de vista da centralização, ou do 
								centralismo, melhor dizendo, que o isolamento de 
								Brasília suscita na burocracia encarregada de 
								reorganizar o conhecimento, nada mudou de 
								substancial, um fato, no entanto, precisa ser 
								destacado. Trata-se da existência de sólidas 
								associações científicas, com interesses focados 
								em algumas metas peculiares, porém com o sentido 
								holístico de conjunto. Intercom, FNPJ e SPBJor, 
								neste momento, demonstram entender o grave risco 
								capaz de detonar a força social e institucional 
								conquistada pelo Jornalismo, sempre bombardeado, 
								nos momentos políticos mais sensíveis, sobretudo 
								durante os regimes de exceção. E apresentam-se 
								como coletivos aglutinadores e capazes tanto na 
								formulação das críticas como, igualmente, 
								imbuídos de vigorosa disposição propositiva.
 A mais antiga, a Sociedade Brasileira de Estudos 
								Interdisciplinares da Comunicação (Intercom), 
								nascida em 1977, acaba de vir a público, com 
								nota contundente, para mostrar sua perplexidade 
								diante da Tabela divulgada, que na área da 
								Comunicação inclui Teorias da Comunicação, 
								Processos Sociais, Mídias, Relações Públicas e 
								Propaganda, e Estética e Linguagem. No entanto, 
								lembra, nos dias 21 e 22 de maio deste ano, 
								reunidas em S. Paulo, as três associações 
								científicas haviam estabelecido o consenso de 
								que a área da Comunicação seria dividida em 
								sub-áreas compreendendo Epistemologia da 
								Comunicação, Cinema e Audiovisual, Rádio e 
								Televisão, Jornalismo, Relações Públicas e 
								Comunicação Organizacional, Publicidade e 
								Propaganda, Editoração e Cultura do Impresso, 
								Cibercultura, Cultura Mediatizada e Comunicação 
								e Interfaces. Essa proposta de organização do 
								campo comunicacional vem respaldada por 
								princípios históricos, teóricos, técnicos e 
								tecnológicos, coletivamente construídos.
 Como lembra a nota da Sociedade Brasileira de 
								Pesquisa em Jornalismo (SBPJor), nascida há três 
								anos, que congrega cerca de 200 membros, 
								brasileiros e portugueses, 84 dos quais 
								doutores, a cassação do status de sub-área do 
								Jornalismo contraria toda uma tradição 
								legitimada ao longo de mais de 300 anos, quando 
								da defesa da primeira tese de doutorado, em 
								1690, por Tobias Peucer, na Universidade de 
								Leipzig, na Alemanha. No plano mundial, 
								acrescenta, está uma história envolvendo quatro 
								séculos de existência como prática profissional, 
								300 anos como objeto específico de pesquisa, 100 
								anos como disciplina acadêmica e presença como 
								área em todas as Tabelas internacionais.
 O Fórum Nacional de Professores de Jornalismo (FNPJ), 
								nascido em 1994, com a preocupação de zelar pela 
								formação acadêmica em Jornalismo, nas condições 
								técnicas e éticas de melhor padrão, numa 
								sociedade que se pretende construir na 
								democracia, acaba de intervir também 
								vigorosamente nesse debate, manifestando sua 
								estranheza diante da retirada do Jornalismo como 
								sub-área da Comunicação. É inadmissível  
								lembra a sua nota - que o Jornalismo, 
								estabelecido como campo técnico no Brasil há 
								quase 200 anos; como profissão, há quase 100 
								anos; como área de ensino, há mais de 60 anos,
 receba, de uma hora para outra, e para surpresa 
								das partes consultadas, tratamento anômalo, 
								passando a ser classificada como especialidade 
								entre mil e tantas outras. Voltando para a 
								questão da decisão da Justiça Federal, que 
								desregulamentou a profissão de Jornalista, o 
								recurso da Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) 
								e do Sindicato dos Jornalistas de S. Paulo, 
								depois de uma demora que na prática permitiu o 
								ingresso na profissão de centenas de registros 
								precários, comprometendo toda uma política de 
								qualidade, está prometido para ser julgado até o 
								dia 26 de outubro. A sociedade, como um todo, 
								precisa estar alerta neste episódio. Não se 
								trata de uma simples decisão judicial, uma 
								querela qualquer. Trata-se da luta pela 
								manutenção da regulamentação de uma profissão 
								chave para todo o projeto de res pública que vem 
								sendo adiado, ano após ano, desde a constituição 
								do Estado brasileiro.
 No plano da pesquisa e da formação, com nossas 
								associações científicas, como Intercom, FNPJ e 
								SBPJor, precisamos mostrar, com estudos bem 
								fundamentados, a diferença entre o jornalismo 
								praticado até meados dos anos 1960, destinado, 
								no geral, a confirmar o poder de quem o exercia, 
								pela corrupção, pelo coronelismo ou pelo 
								dinheiro, e as alterações, técnicas e éticas, 
								num crescendo, proporcionadas pela formação 
								universitária, pela pesquisa e pela dignidade de 
								uma profissão legal e socialmente reconhecida.
 Essas mudanças são visíveis não apenas nas 
								metrópoles, mas principalmente nos mais 
								distantes e isolados pontos desse país 
								continental, onde a profissionalização do 
								trabalho jornalístico vem lentamente rompendo 
								com a tutela dos velhos donos da verdade.
 Como se vê, todo o debate sobre a comunicação, e 
								do jornalismo, em particular, está 
								umbilicalmente ligado ao projeto que se tem para 
								o país.
 Não podemos sequer sonhar com uma luta puramente 
								corporativista. Seria apostar no atraso e 
								entregar o ouro para o bandido.
 
 *Jornalista, doutor em Ciências da Comunicação e 
								professor da Universidade Federal do Amazonas.
 
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